O medo da chuva
24 de outubro de 2020.
um sábado de uma pandemia infernal.
A chuva vinha ameaçando despencar a alguns dias mas apenas hoje, ela finalmente cumprira o que prometeu. O céu ficou escuro e os barulhos assustavam. Pude notar uma certa agonia na minha mãe. Todos poderiam saber o que era aquilo. Medo. O medo da chuva. Eu, como uma observadora, vi a noite chegar mais cedo acompanhada de trovões, fiquei agoniada. Tenho aquela impressão de que precisaria arrumar a mala o mais depressa possível, pegar apenas as coisas importantes e me esconder, como se a vida dependesse disso. A chuva veio, forte. Algum tempo depois, o céu foi ficando mais claro junto os meus pensamentos. Tentei puxar da memoria onde o meu medo de chuva começou, qual seria a historia por detrás de tantas rezas e tremores mas não consegui pensar em nada. Talvez porque não tenha uma historia. Cresci vendo minha mãe se preparar antes que a chuva chegasse, e eu como a filha mais nova, que tenta imitar a mãe em tudo, me preparava também, um costume que pegamos da minha avó. Então mais velha, relacionei o medo da chuva com o catolicismo fanático praticado pela minha família, a minha avô sempre acendera uma vela, quando o temporal estava muito forte, e na área externa rezava com fé para que as nuvens do céu se desmanchassem e eu fazia a mesma coisa quando criança, sem entender para quem estava ou porque estava pedindo, coberta dos pés a cabeça e com os olhos marejados, pedia para aquele que morava acima de nós, não me matasse. E hoje, sábado, ainda com fé mas em nada muito especifico, me dei conta de que esse medo não é meu, nunca foi. Não acredito em dilúvios bíblicos e mesmo assim temia, muito. Quais medos são nossos? Daqueles que conseguimos lembrar sua origem? E por qual motivo não aprendemos a soltar a pesada bagagem que colocaram em nossas costas? Eu sempre amei tomar banho de chuva mas em 22 anos, se fiz isso por duas vezes, foi muito. Não me permitia aproveitar um tempo chuvoso porque estava me preparando. Para que? Não faço ideia. Nem tudo o que é do outro, te pertence. Não posso esquecer. Não deixemos que nos tirem os banhos de chuva.
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Me desculpe por ter ido embora quando você precisou de mim, mas eu também precisava de mim mesma.
Ez. (via inteirato)
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