“Don’t let my silence wound you. I'm just tired of words.”
— Manuel Bandeira, from “This Earth, That Sky.”
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Espiral
Não tem como aproveitar um último cigarro. Não tem como se contentar com um último toque. Talvez seja melhor que as coisas evanesçam sem percebermos do que nos enganar com uma pretendida satisfação da “última vez”. Não há satisfação em imaginar o resto da vida sem aquilo que naquele mesmo instante oferece prazer. É uma ilusão. Uma última vez só intensifica a vontade de uma próxima vez. Uma última vez encadeia outra última vez. Não tem como se entregar ao prazer fugaz ao sabê-lo derradeiro; ao saber que ele toma a oportunidade de prazeres vindouros. É tudo um engano, uma autotortura. Uma vida de privações é insípida. A vida foi feita para ser uma espiral. Ascendendo, evoluindo, mas ainda em círculos.
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Enrico Butti The Dream of Death (1890)
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"I don't want your love unless you know I am repulsive, and love me even as you know it."
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April 26, 1931
Journals of Anais Nin 1927-1931 [volume 4]
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Rio
Um olhar que se arrasta
um segundo a mais
sobre a presa
Sobra a pressa
e o desejo
por mais um segundo
O mundo em chamas
estou tocada
você clama
ligações à meia-noite
uma música nova
retorna
em um olhar
Tardes que não acabam
como se pudéssemos
nos liquefazer
e nos fundir
num rio infinito
que suspira coletivamente
por todos os amores
Datas marcadas em um calendário
só o que sobra no leito seco
é a eterna vontade
de que tivesse durado
um segundo
ou um século
a mais.
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opening tumblr is like stepping into the woods at night and listening to the chaotic screams of wandering spirits
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Summer love
Sinto que perdi a cola
como um adesivo gasto
Dois dias ausente
e ausente permaneci
Minha presença se grudou em você
e não tenho conseguido mais colocar meus pés no chão
Esses sentimentos trovejantes sempre nos deixam
como fantasmas
Eu nunca sei se sou eu que continuo alimentando a fornalha
ou se é o fogo que me consome como se eu fosse uma fênix
Nesses dias quentes, tão longos e efêmeros
quando não consigo acelerar o tempo
só me pergunto
se a chama que carrego nesta vela
vai murchar e se extinguir
ou se você vai soprar
até causar um incêndio
Eu sei que você é água
mas acredito que seja do tipo
que só serve para deixar o fogo ainda mais brilhante.
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Julia
Cama desfeita
Um luto que não encontra descanso
Noiva eterna
de uma união consumada
às avessas
Noite eterna
Unidade de sangue e dor
O amor pode ser mais destrutivo
que a morte
Amor tecido no escuro
em luto, segredo e desespero
Apaixonar-se por um monstro
não torna o amor
menos real
Apenas os impulsos
mais assassinos.
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“Love is a sacrament that should be taken kneeling”
—Oscar Wilde
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Autofagia
Este sentimento
é como um parasita
Instala-se contra a minha vontade
devora tudo que absorvo
com outros fins
e no fim
se torna maior que eu
me engolindo de dentro pra fora
me transforma em outra coisa
diferente de mim.
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Beladona
Sua visão
me enche de ternura
ao ponto de me afogar
A palavra amor escorre da minha boca
como um remédio que se tornou veneno
Só é difícil de falar
eu não sei falar de amor
eu não sei falar amor
Submersa
eu apenas engulo
o veneno
e as palavras
Mas se afogar, amor
é sempre sufocante
Essa ternura
me destrói.
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Choque térmico
Últimos dias de inverno
está frio, frio, frio
A água quente do chuveiro
entrechocando contra a pele
um conforto
eletrostático
Mas a água não é quente
como a lágrima
que resvala como se estivesse
queimando a pele
quente, quente, quente
A água não disfarça.
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Prece
Não sou seu inquisidor
nem um tipo de sacerdotisa
Não é para mim
que devia se ajoelhar
Não tenho poder
para te absolver
dos seus pecados
Sou mais um dos teus pecados
Mas você não pedirá perdão
por isso te perdoo
para reconstruir tua escada ao paraíso
que eu mesma fiz cair.
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