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acuidade-dormente · 2 years
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Sonho sobre assalto de morte
Faz algumas horas desde o sonho.
Eu estava deitado em um colchão, na sala da casa onde vivo atualmente. Estava com roupa de dormir, mas era dia, provavelmente já era tarde, entre às 15h e 16h. Meus pais não deviam estar em casa, nem minha irmã. Eu assistia algum filme do Estúdio Ghibli, era um dos produzidos mais para o público infantil, não lembro qual. Eu estava em um estado de consciência muito invulgar. Sei que depois de um bom tempo nesse estado, de súbito, me senti um pouco ameaçado, como que sendo observado por algo, como uma premonição. Foi um sentimento passageiro e nada que viesse a me perturbar, uma intuição acanhada e incerta, então, apesar disso, continuei bem e tranquilo. Eu estava deitado ao lado do corredor, logo atrás da porta do quarto dos meus pais. Em algum momento eu voltei o rosto para trás, em direção à porta, que estava entreaberta, havia um homem ali. Era uma figura repugnante, eu o via por detrás da fresta da porta. Era alto, corpulento e desengonçado. Tinha uma cabeça grande, alguns pelos falhados, distribuídos de forma irregular pelo corpo e rosto. Ele tinha a pele gordurenta, com um péssimo aspecto, coloração meio amarelada e cinzenta, cheia de manchas e muito suja. Ele tinha na mão uma faca velha, pontiaguda, ou era um navalhete, não lembro bem, fui tomado pelo pavor. Ele abriu a porta e se aproximou com um sorriso detestável, a expressão era rígida, como se o rosto estivesse paralizado. Ele se aproximou mais enquanto apontava a arma para mim, eu pedi — “Pelo amor de Deus, não faz nada comigo!”. Não houve tempo de reação, eu só pensei muitas coisas naquele instante, diante de uma morte violenta. A sensação foi terrificante, o medo atravessou os sentidos em direção à carne e meu corpo foi dopado por ele. É o sentimento de morte. Já o senti na vida consciente, em algumas ocasiões como, a iminência de um assalto a mão armada, diante de um alto perigo de vida, como quando estive em meio a tiroteios e não havia onde se refugiar. Um sentimento que nos toma quando não se há o que fazer, algo que paralisa todos os músculos do corpo como se tivéssemos sido atingidos por uma descarga elétrica. O coração dispara com batidas pesadas e profundas. Acredito que é assim que uma pessoa se sente, momentos antes da morte, quando se cai da janela de um edifício alto, ou quanto se é atingido por um tiro fatal, quando se vê diante de um atropelamento inevitável. Decidi despertar do sono, atravessei o véu e tomei consciência de si, deitado na cama. Fiquei paralisado por uns segundos ou minutos, esperando a energia se dissipar do meu corpo. Removi as cobertas, estava com calor e depois, continuei parado. Agora, estava tranquilo.
18 de Fevereiro de 2020.
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Leatherface, Texas Chainsaw Massacre, 1974.
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acuidade-dormente · 2 years
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Sonho com tarde de chuva
Já não lembro muitos detalhes desse sonho, então, talvez eu amplie a experiência enquanto escrevo. 
Estávamos juntos, pelo que lembro ela usava um agasalho de lã, (um moletom ou uma camiseta de mangas cumpridas), usava uma bermuda jeans e meias nos pés, eu também usava meias, mas não lembro bem o conjunto que eu estava usando. Era um dia chuvoso e fazia frio. O ambiente onde estávamos não era nem de longe luxuoso. Eram dois cômodos, o que estávamos, e um outro, num andar superior, não lembro bem se o acesso ao outro cômodo era por uma escada de madeira ou por um corredor, de todo modo, ambos os cômodos dispunham de características semelhantes, paredes de tijolos nus, sem emboço e chão ainda em contrapiso, sem cerâmicas. Na sala onde estávamos haviam poucos móveis, um ou dois sofás, cobertos com panos finos e meio gastos, descoloridos, um tapete velho de aspecto meio sujo cobrindo o chão grosseiro, uma televisão de tubo sobre um reck empoeirado, passando qualquer coisa em volume bem baixinho. O ruído da televisão se misturava ao da chuva caindo sobre o telhado de amianto.  Nós atravessamos o corredor, (ou subimos a escada) e lembro que a passagem de um cômodo para o outro era aberta ao tempo, pegamos um pouquinho de chuva. Era uma chuva fina e constante. O andar superior era ainda mais desprovido de bens. Haviam uns colchões e uns farrapos sobre o chão. Esse cômodo mais parecia um terraço do que qualquer outra coisa. O telhado de amianto era sustentado por vigas de madeira, baixas, de modo que na parte mais alta, minha cabeça tocava as telhas enquanto eu estava de pé. O ambiente era cercado de muretas, exceto pela face que dava para rua. Haviam umas outras casas na frente, o que nos garantia alguma privacidade de quem pudesse passar na rua, embora eu acredite que numa tarde chuvosa como aquela, dificilmente algum curioso passaria observando lajes e janelas de casas alheias. Eu me sentia muito confortável ali, meu corpo estava relaxado. Era uma situação muito amistosa, estávamos sozinhos e isso gerava em nós certa excitação, e não me refiro a um sentimento de um todo erótico, eu me sentia silenciosamente entusiasmado, mas era um entusiasmo sereno, quase pueril, embora pudesse flertar, em algum grau, com intenções dúbias. Ela me desejava, e acredito que pudesse estar apaixonada. Os gestos e a forma como me tocava não poderiam me deixar estar enganado. Acho que isso me perturbava um pouco, porque eu não poderia corresponder a esses sentimentos. Ela, porém, parecia saber disso e, naquele momento, não demonstrava nenhuma preocupação. Éramos jovens. Pensando agora  sobre esse sonho, me sinto um pouco melancólico, era um momento tão tranquilo e não consigo imaginar uma situação real onde conseguiria me sentir assim de novo. Ela me afagava e meus sentidos flertavam entre o tesão e o descaso. Nós deitamos e ficamos observando o morro, quase oculto pela chuva fina. Eu sempre achei a paisagem da favela muito bonita, me sinto em paz quando as observo. Lembrei das inúmeras vezes que vi, da varanda de casa, a chuva cair sobre o morro, sobre os barracos e sobre as ruas sem asfalto. Nunca sabemos quando é a última vez que fazemos alguma coisa, seria bom se pudéssemos sermos avisados disso, pra aproveitar um pouco mais. Nós dois, deitados, apreciávamos muito estarmos juntos ali. Estava frio, mas nossos corpos, próximos, estavam quentes, pareciam febris. Tudo diante de nós estava cinza, monocromático, não dava pra saber onde eram os limites entre o céu e a terra, estava tudo da mesma cor. O mundo parecia indisposto e despreocupado naquela tarde. Nós também estávamos despreocupados, então nos beijamos e transamos. 
13 de Setembro de 2019
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acuidade-dormente · 2 years
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Sonho e assassinato.
Tive outro sonho que precedeu este, mas não vou mencionar.
Eu estava deitado na calçada em frente a minha casa, enrolado sob edredons, era uma calçada alta em relação ao nível da rua. Era noite, madrugada, uma noite fria, caía uma chuva fina e aguda, muito gelada, eu estava com muito medo, um sentimento de pavor se revolvia dentro de mim e se misturava à pulsões violentas e primitivas, eu estava perturbado e inquieto. Subia um carro, a rua era uma rua larga de paralelepípedos, e dava para uma via movimentada, era um lugar com altos índices de violência, haviam conflitos e assaltos constantes ali. O carro subia e quando estava se aproximando eu saí de dentro do cobertor, bruscamente, com a intenção de assustar, embora estivesse com muito medo, foi uma reação raivosa. Era um carro antigo, uma Paraty ou um Santana, o motorista o guiava sozinho, era um jovem de no máximo 30 anos, eu o assustei. O carro seguiu rua acima. Eu me sentia apavorado, um medo que me consumia, isso me fez querer entrar para casa. A casa estava com o muro caído, por isso eu temia de entrar e ser surpreendido enquanto dormia, havia um muro externo, esse estava caído, depois outro muro, baixo, que dava para o pequeno jardim, e o quintal e a porta de entrada da casa. Eu pulei o escombros do muro caído e o outro muro baixo, entrei na casa. Precisava verificar se não havia já alguém ali. Preciso reforçar que era minha casa, a casa dos meus pais, embora a divisão dos cômodos e a estrutura fosse diferente de todas as casas onde já vivi. Eu entrei silenciosamente, a casa estava escura, mas eu sentia a presença de alguém ali, ou pelo menos, estava tão apavorado e ansioso, que esperava que as sombras tomassem forma e se convertessem em um adversário. Eu entrava pela cozinha, depois seguia para a sala e da sala escura, confortável, se comparado à rua, me dirigi para o quarto, havia uma porta pintada de branco, eu a abri com muita truculência, então ouvi um gemido de dor, eu espremi alguém contra a parede. No chão atrás da porta, estava um corpo estirado, enrolado em um edredom, assim como eu estava, quando na rua. Esse homem estava na minha casa, era um estranho. Eu fui tomado de uma hostilidade e de um pavor que fez todo meu corpo ferver. Eu perguntei, com voz ríspida e elevada — "quem é você?", não ouvi resposta, mas sentia o calor daquele corpo. Me sentia terrivelmente ameaçando, eu apertava a porta contra a parede, esmagando aquele corpo e ouvia os gemidos. — "Quem é você?! Fala!! Estou com uma faca!", e eu estava mesmo, uma faca de cozinha, grande, desgastada e pontiaguda. Não obtive resposta, então eu enfiei a faca diversas vezes naquele edredom, onde imaginava ser o pescoço do homem, sentia a faca penetrar a pele e atravessar a carne, sentia os ossos desviando o caminho das estocadas. Desferi muitos golpes, até sentir que o corpo esfriar. Já não era mais uma ameaça. O sangue manchou o edredom, mas foi no chão onde ele escorria grosseiramente. Era um sangue escuro e muito espesso. Eu acordei, com o corpo rígido, muito tenso, como se tivesse sido eletrocutado.
11 de Junho de 2022.
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Body of Dead Icarus - László Máthé.
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Man laying on the ground - Paul Cézanne 1862-1865.
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acuidade-dormente · 2 years
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Yume, Kurosawa Akira, 1990.
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acuidade-dormente · 2 years
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1. Egon Schiele, Two Women Embracing, 1911
2. Demri Parrott and Rosheen Raugi, Seattle 1993
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acuidade-dormente · 2 years
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Sonho em Portugal e meus pais.
Já passaram umas boas horas desde o sonho.
Estávamos em Portugal. Talvez visitando, mas acredito que eu já estava estabelecido por lá. Eu tinha uma companheira, porém não saberia dizer quem era. Meus pais estavam lá, provavelmente nos visitando. Eu estava alegre com isso, genuinamente muito feliz. Tinha uma expectativa de que eles poderiam retornar várias outras vezes, e parecia que já o tinham feito. Lembro de estar intimamente comovido com a presença dos meus pais, como quando reencontramos alguém por quem sentíamos muita saudade, (senti isso poucas vezes, ou talvez nenhuma vez, só em sonhos, onde reencontrei pessoas que não estão mais entre nós). Era um sentimento que não tenho certeza se já experimentei na vida consciente. O lugar parecia um pouco com uns cantões de São Pedro da Aldeia. Nosso apartamento, especificamente, parecia um apartamento que quase compramos, anos atrás, em uma visita a São Pedro. Era uma rua de paralelepípedos, muito bem conservada. Era uma manhã ensolarada, mas estava muito fresco, clima ameno, frio para o padrão Rio de Janeiro. Meus pais estavam com mais frio que eu, talvez porque eu já estivesse acostumado. Lembrando agora! O lugar também parecia com as ruas de Ouro Preto. Meus pais comentavam sobre como o lugar era bom, e realmente era. Fomos até um comércio, um pequeno mercado. Com pouco dinheiro eu pude comprar várias coisas, inclusive coisas que aqui são muito caras. Minha mãe ficou maravilhada, e quis investigar a possibilidade e irem viver lá também. Essa hipótese preencheu meu coração de felicidade. Isso me fez muito feliz. Talvez eu estivesse incompleto lá, e com eles por perto, eu estaria plenamente feliz.
22 de Janeiro de 2022.
Sonho em Portugal.
Estive na Europa, em Portugal. Era aniversário do meu pai(?) e fomos a Portugal. Não lembro quase nada, mas tenho a impressão de ter sonhado por algumas horas.
17 de Novembro de 2019.
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Porto, Portugal, 2018.
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acuidade-dormente · 2 years
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Sonho que lembrei repentinamente.
Acabei de lembrar que sonhei.
Estava só diante de um céu noturno, muito escuro, então vi quando uma estrela cadente passou, o céu estava muito estrelado, era belo. Eu estava só. Foi uma experiência pacífica. Talvez sejam meus pensamentos sobre Portugal.
10 de Dezembro de 2021.
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Howl no Ugoku Shiro, Hayao Miyazaki, 2004.
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acuidade-dormente · 2 years
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A tormented man, Leonard Baskin, 1953.
Por que estou acordado?
Por que estou tão acordado? Desde 4h estou acordado. Minha mente não se detém em nada. Não penso com clareza. Só há muito ruído. Eu não gostaria de estar assim, eu não gostaria de estar em mim. Imoral e deprimido. Quando esse tempo vai passar?! Quando isso tudo vai terminar?! Quero um pouco de paz. Quero ser feliz.
4 de Janeiro de 2022.
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Saint Anthony with red monster, Leonard Baskin, 1952.
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acuidade-dormente · 2 years
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Sonho com moça mulçumana.
Tive um sonho maravilhoso, namorava uma moça mulçumana em um país árabe, no Norte da África, (Marrocos, Egito, Líbia...) estávamos terrivelmente apaixonados, havia uma tensão de desejo ardente entre nós e ao mesmo tempo, algo sagrado em nossa troca de olhares. Lembro de temer a hostilidade do pai da moça, pois poderia se manifestar de formas severas, tanto para mim, quanto para ela. Naquele dia, nos beijamos sob a luz quente de um poste velho, foi um beijo mais pesado que o céu, inspirava um sentimento reverente, respeitoso e sagrado. Também foi doce, seus lábios eram muito delicados e macios. Não lembro bem, mas era fim de tarde, o dia despontava e a noite chegava, lembro que alguns cachos de seus cabelos saiam pelas frestas do hijab, eram cabelos cacheados e castanhos. Naquela moça, convergiam todas as minhas aspirações, todos os meus desejos e todas as forças da minha vida.
31 de Dezembro de 2016.
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Marrakech at Night, Hecktic Travels.
Sobre fantasmas.
Há anos eu a persigo, a procuro e não encontro. Minha paixão de longa data, meu amor platônico. Já nos esbarramos em algumas ocasiões, mas nunca vi seu rosto. Já a ouvi em pessoas que tomaram as palavras de seu vocabulário. Já presenciei alguns dos seus gestos sendo coreografados por desconhecidos. Mas, ainda não a encontrei. Talvez ela permaneça lá, eternamente jovem, enquanto eu definho no tempo e na vida, enquanto me desfaço, até que já não possa mais lembrar.
22 de Maio de 2022.
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acuidade-dormente · 2 years
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Sonho com sete garotas mortas.
Haviam sete garotas mortas, alguns diziam que havia sido um assalto, mas evidentemente não era. Algumas estavam baleadas, os corpos estavam sobre o asfalto quente da Avenida Brasil. Fiquei impressionado com os buracos dos tiros no corpo de algumas. Uma no meio do tórax, outra na cabeça. Havia uma, que me chamou mais atenção, parecia ter sido esfolada, a pele estava com um aspecto péssimo, esverdeada, purulenta, os ossos estavam à mostra, foi uma visão horrível. A amiga de umas das meninas mortas estava a segurado, com o corpo meio esfolado no colo. As pessoas estavam ao redor dos corpos como se fossem abutres.
10 de Março de 2022.
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Female Cadaver, Hyman Bloom.
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San Bartolomé, Iglesia de San Laureano, Boyacá, Colombia.
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acuidade-dormente · 2 years
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Eu gosto muito de ruínas, de observar e de caminhar entre elas, evocam em mim sentimentos que não me pertencem originalmente. Quando estou entre ruínas, participo de suas memórias e afetos, as ruínas não se situam nem no passado, nem no futuro, habitam um tempo suspenso, imperecível, essa condição inspira em mim algo que transcende a admiração, ruínas são para mim, veneráveis. Fotos, músicas, histórias e memórias, caminhar entre ruínas. Venero lembranças, guardando-as diante de um altar, erigido em meu coração, preservadas do desvanecer das memórias comuns. Esse exercício de conservação, porém, além de agregar a elas algo onírico e uma assimilação arquetípica, me permite também, com o passar do tempo, novas hermenêuticas. Constantemente me vejo vagueando em lembranças, caminhando entre os barracos da Nova Holanda, pisando o chão de barro vermelho batido, sentindo o mormaço de dias de verão, o cheiro de feira, o samba do bar, o samba da casa de tia Laura... É preciso mencionar que nem sempre essas lembranças me pertencem, no sentido de ser o sujeito que as vivenciou, eu me aproprio delas para acessar outros mundos, experimentar tempos alheios. Sou um andarilho das ruínas de minha mãe, mulher jovem, nordestina, de pele escura, pobre, filha preferida dos pais, irmã mais querida entre os irmãos. Eu ando reverente entre essas ruínas, venero o caminho, sei que piso solo sagrado. A memória é uma senda que devo manter sempre descoberta e clara, não sei o que seria de mim caso perdesse esse caminho, talvez eu me perderia de mim mesmo.
02/03/2022
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Fotos de Bruno Barbey, Rio de Janeiro, 1980; Maranhão, 2000; Bahia 1970.
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acuidade-dormente · 2 years
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Sem saída de si
Estar dentro de mim, nesses últimos dias, tem sido terrível. Habitar esse corpo. É como querer dormir, estar profundamente cansado, mas tentar repousar em um ambiente ruidoso, um ambiente cujos ruídos são ensurdecedores e terrivelmente irritantes.  Um estado permanente de inquietude. Uma ardência constante, sal sobre uma ferida incurável. Uma farpa sob a unha, uma farpa dotada de uma inteligência vil, programada para penetrar cada vez mais a carne, de modo a não ser nunca esquecida. Um sono intranquilo, jamais consumado, um estado de vigília em angustia, uma habitação na penumbra, um estado morno de alma, entre a morte e a vida, mas nunca na morte, nem nunca na vida. Uma irrealização de tudo. Uma incompletude infinita. Um chamando pelo surdo e inominado. A não correspondência. Sinto iminência de um grande rompimento, uma angústia pelo mal vindouro, um mau pressagio que faz estremecer os ossos, de maneira tão perturbadora que confundo o desejo de escapar com o de ser acometido.  A casca em que habito não me comporta mais, agora.
01/01/2022
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The Hull, Hyman Bloom.
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acuidade-dormente · 4 years
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Sobre o fim do nosso mundo.
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Quando estou infeliz, o suficiente para não conseguir ver nenhuma saída para minha vida, eu costumo criar universos nos meus pensamentos, universos trágicos, mas onde aquela condição que me angustia já não possa mais me afetar. Um mal maior que o meu, e que afeta a todos, não apenas a eu mesmo. Quando tragédias acontecem, mas todos nós somos afetados por elas, parece que são mais amenas, embora possam ser grandes catástrofes. Talvez a razão que justifique essa sensação seja o fato de que eu, como individuo, já existo numa dimensão pré-catastrófica, durmo mal quase todos os dias, porque aparentemente, todo amanhã pode trazer consigo um grande novo problema meu. Talvez minha vida já aconteça num assombro e quando as sombras avançam e desapareço, imerso na sua escuridão, o desejo de viver desaparece comigo. Nessas horas, aquele impeto de vida, o desejo inalienável de liberdade, das dimensões recônditas do ser, resfolega. E minha mente é levada a divagar por mundo devastados. Imagino um mundo pós-capitalista, mas não que tenhamos superado a condição capitalista, me refiro a um mundo que implodiu, que não nos suportou e desfaleceu, extremamente cansado. Esse mundo milimetricamente cooptado por interesses escusos, sistematizado ao longo do tempo de um modo perverso, um mundo operando contra sua natureza, que resistiu por muito tempo à uma forma de existir que contrariava sua existência, um mundo que se libertou de nós, de modo brusco, num movimento revoltoso e violento, um assalto de força, um último suspiro antes de morrer para renascer. Imagino uma desolação muito bonita, onde não teríamos mais posses, nem teríamos o conforto com que nos habituamos, cercados de toda tecnologia, de todo o progresso científico que tanto nos assegura dos problemas que nós mesmos nos causamos. Um mundo sem mercadoria, sem fetiche, cujos grandes edifícios se converteram em enormes jardins verticais. Um mundo onde os galhos das árvores crescem para dentro das casas, casas onde já não habitam mais ninguém. Os homens não tem mais seus negócios, suas amantes, seus clubes para reafirmarem suas próprias identidades, as mulheres não se iludem mais com superstições que sustentem seus ideais morais, artificiais, fabricados pelas necessidades desse antigo sistema, os jovens não se dissolvem mais numa vida sem significado, diante de telas de aparelhos eletrônicos, embriagados por ambições ambíguas. Todas as nossas instituições tiveram fim, porque agora vivemos para viver, estamos ocupados com nossa vida. Todas as coisas que são como são, já não haveriam de ser. E considerando que as angústias de nosso tempo derivam basicamente do fato de serem as angústias do tempo que é nosso, já não haveriam então essas angústias no tempo de um novo mundo.
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acuidade-dormente · 4 years
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Estou cansado e sufocado demais. 
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acuidade-dormente · 4 years
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Sem título, Zdislav Beksinski.
Sobre a porta secreta.
Lembro de sonhar algumas vezes na infância, com uma pequena porta secreta que havia no lugar mais escuro de minha casa antiga. As vezes era um lugar medonho, e em outras ocasiões, era um lugar de felicidade, cheio de brinquedos e jogos de super-nintendo. Gostaria de reencontrar o caminho para essa porta secreta mas meu medo do escuro se dissipou junto às lembranças do caminho. Frequentemente sinto que gostaria de deixar essa minha vida, nascer em outro lugar, viver noutro corpo, poder fazer as coisas de novo e de formas diferentes. Aproveitar melhor meu tempo. Acredito que muitas pessoas desejam isso também, mas estou infeliz demais para ter empatia. Eu gostaria de ir embora dessa vida, eu gostaria de desaparecer, gostaria de que quando chegasse a hora da morte, pudesse me despedir feliz.
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acuidade-dormente · 4 years
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Sobre felicidade, infância e sonhos.
Talvez o dia mais feliz da minha vida tenha sido aquele, há uns vinte anos atrás, quando meu pai nos levou à Praia do Meio, lembro de ter certo medo de chegar ali, tudo era grandioso e parecia ser perigoso. Eu tinha medo de tudo e tudo me encantava muito, tudo era vislumbrante. Lembro de várias ocasiões em que estivemos ali e todas essas lembranças se misturam em minha mente, de modo que parecem ter sido todas em um dia só. Lembro do dia em que estávamos, eu, meus pais e meu irmão Renato. Naquele dia nós dois brincamos muito, até eu ficar exausto, eu ri e me diverti muito, a gente brincava de "lutinha", era muito bom cair na água. Talvez tenha sido naquele dia que vi um peixinho amarelo, azul e preto, que parecia ter saído de um aquário. Talvez também, seja o dia em que reparei o avanço da maré com o passar das horas. Eu brinquei tanto naquele dia, que acho que foi difícil para subir a encosta para voltar. Meu sonho de 31 de outubro de 2016, me lembrou de como esse dia foi feliz, no sonho estivemos juntos ali, mais uma vez, resgatando o irresgatável. Hoje não sei distinguir muito bem o que foi sonho e o que foi realidade, de tão feliz que fui. Foi uma felicidade tão grande que quando lembro me sinto terrivelmente infeliz. Foi uma felicidade tão grande que nem sei se foi real. Sinto um vazio muito grande ecoando dentro de mim, quase consigo ouvir o que diz. Sinto um desejo muito grande de viver, um desejo muito grande de ser feliz. Sinto que meu coração está ressecado, frágil feito folha seca. Eu me sinto muito sozinho e sei que não posso mudar isso, estou sozinho dentro de mim. Estou abandonado dentro de mim. Me sinto muito triste, como se houvesse perdido alguém, e talvez o tenha, perdido a si mesmo.
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Nessa cena, Arren, estava sonhando. Esse filme e todos outros do Estúdio são sagrados para mim, tão importantes quanto todas as outras coisinhas que compõem meu altar. Esses filmes me levam de volta ao lugar de onde eu não gostaria de ter saído.
Contos de Terramar, Goro Miyazaki, 2006.
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acuidade-dormente · 4 years
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Sonho sobre símbolos fálicos
Sonhei com duas serpentes que lutavam entre si. Sonhei também com outra coisa, em um segundo sonho, coisas que tenho por mim que representam símbolos fálicos, como as serpentes. Elas também lutavam entre si. Eu pensava que talvez essas coisas falassem de desejo e conflito relacionados à anima. Não lembro mais das coisas do sonho. Mas estive pensando nessas coisas antes de dormir, desenhei obeliscos e torres.
Sonho de 18/04/2020
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Gravura ocidental, de 1727, mostrando Istambul (Constantinopla), ao fundo o Obelisco Theodosius e a Coluna Serpentina, este segundo objeto pode ter mais de 2500 anos, embora danificados, estão de pé ainda nos dias de hoje.
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