Tumgik
Geriatria I
Era final de tarde e caminhar pelo jardim das cerejeiras era quase que um ritual entre mim e meu pai. Desta vez tive que vir sozinho. O sol abrasador em suas cores mutáveis parecia deleitar- se sobre minha pele. O ar fresco por entre narinas adentravam meu corpo e pulmões inflavam de amor a vida como jamais havia amado, e de tanto amar escorria por entre meus olhos as doces lembranças das brincadeiras de outrora quando ainda era criança no colo amado, fraterno, paterno. Meus passos são outros, o tempo é outro, até mesmo as flores de cerejeira são outras, mas as árvores, as raízes e sua terra eram as mesmas daqueles dias, guardando memórias, segredos e medos que só nós dois sabíamos e compartilhavamos quase como rituais sagrados de orações interminantes. Era tempo de água, de líquidos, de temperaturas temperadas, de corpo molhado nas chuvas que caiam ao final da tarde. Hoje tudo é tão seco, casca, fóssil de metal que me sustenta com toda dor de ainda estar vivo com minhas lembranças líquidas se desfazendo entre meus dedos de poeira e terra. Terra seca.
Leandro Dativa
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