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A educação fiscal como fundamento para a coesão social
Por Alvaro Henrique dos Santos 
A crise fiscal que assola o Brasil atualmente se deve, dentre inúmeras outras questões relacionadas à responsabilidade fiscal, também à forma como a população brasileira lida com a questão tributária. Esse problema está estritamente relacionado à educação fiscal, afinal não somos familiarizados e tão pouco educados ao nosso modelo tributário, a comunicação técnica também contribui para o distanciamento entre a população, da qual não compreende a burocracia, e o Estado. É fato que, para boa parte da população, a má gestão dos recursos públicos traz insatisfação com a questão tributária, principalmente em um país como o Brasil onde há uma elevada carga tributária e pouco retorno a quem mais precisa. Deve-se lembrar que a maior parte da arrecadação de impostos se dá pelo consumo, ou seja, tanto o mais pobre quanto o mais rico pagam a mesma quantia em impostos, caracterizando uma forma de tributação regressiva em oposição a muitos países desenvolvidos, porém quem é beneficiado pelo retorno de impostos são os mais ricos, o que justifica ainda mais tamanha insatisfação.
Com a Lei 4.320/64, institui-se normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. A Constituição Federal de 1988, no art. 165, dispõe instrumentos de orçamento e planejamento público estabelecidos pelo Executivo de forma hierarquizada, onde se é disponibilizado aos Poderes a receita, despesa e estimativa de arrecadação de impostos, e foca-se na gestão dos recursos. Vale ressaltar a Lei Complementar 101/00 e 131/09, que fortaleceram a transparência ao planejamento e execução orçamentária, mostrando que mesmo com esses mecanismos importantes o Estado pode acabar falhando, principalmente quando trata-se da sonegação fiscal. Porém, há ferramentas que poderiam contribuir para maior equilíbrio fiscal e controle por parte da população dos recursos destinados ao Estado por meio da educação fiscal.
A educação fiscal visa a conscientização da sociedade quanto à necessidade de financiamento do Estado através da arrecadação de tributos, o dever do cidadão contribuinte de pagá-los e o direito de acompanhar sua aplicação (Brasil, Receita Federal, 2003). É fato que os brasileiros ainda enxerga as questões tributárias como algo interno ao Estado, o que é comum tanto pela comunicação utilizada quanto pelo fato de estarmos inserido em uma democracia inercial. A educação fiscal também contribui para a população não aceitar injustiças, como as que vivemos no atual cenário socioeconômico. Por exemplo, um dos grandes esforços do governo Bolsonaro é promover a Reforma da Previdência, que entre outros pontos deseja implementar o regime de capitalização, que se caracteriza pelo trabalhador ser o único contribuinte para sua aposentadoria, sob o argumento de que a Previdência Social do país está insustentável. Fato é que empresas sonegam bilhões para a Previdência Social, a cobrança desses devedores seria uma solução a curto prazo e a longo prazo poderia-se, por exemplo, implantar a taxação de grandes fortunas e de juros e dividendos como uma forma de arrecadação justa e progressiva para a Previdência.
A educação fiscal deve ser compreendida como uma abordagem didático-pedagógica capaz de interpretar as vertentes financeiras da arrecadação e dos gastos públicos, estimulando o cidadão a compreender o seu dever de contribuir solidariamente em benefício do conjunto da sociedade e, por outro lado, estar consciente da importância de sua participação no acompanhamento da aplicação dos recursos arrecadados, com justiça, transparência, honestidade e eficiência, minimizando o conflito de relação entre o cidadão contribuinte e o Estado arrecadador. A Educação Fiscal deve tratar da compreensão do que é o Estado, suas origens, seus propósitos e da importância do controle da sociedade sobre o gasto público, através da participação de cada cidadão, concorrendo para o fortalecimento do ambiente democrático (BRASIL, 2008, p. 27).
Portanto, deve-se considerar a alta taxa de sonegação e a complexa carga tributária para a formulação de uma Reforma Tributária mais justa para a população brasileira e a adoção da educação fiscal nas escolas, promovendo a responsabilidade fiscal e contribuindo para a coesão social, visto que é via tributação que se têm recursos para que sejam implementadas políticas públicas que beneficiam a sociedade. A educação fiscal têm como finalidade não apenas impulsionar a arrecadação de impostos, mas sim despertar a cidadania incentivando a compreensão da população que por meio da tributação consegue-se realizar políticas públicas que promovam a democracia e a coesão social.
Referências Bibliográficas
BORGES, E. F. et al. Educação Fiscal, Terceiro Setor e Funções De Governo: Uma Análise da Influência do Programa de Educação Fiscal do RN nos Indicadores das Funções de Governo dos Municípios. REUNIR – Revista de Administração, Contabilidade e Sustentabilidade. v.3, nº 4, p. 39-61, Set./Dez 2013.
BRASIL. Ministério da Fazenda. Escola de Administração Fazendária. Programa Nacional de Educação Fiscal – PNEF. Educação fiscal no contexto social / Programa Nacional de Educação Fiscal. 3 ed. rev. e atual. Brasília: ESAF, 2008.
RECEITA FEDERAL. Educação fiscal. Disponível em: <www.receita.fazenda.gov.br>
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp131.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4320.htm
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Corporativismo e associativismo: as associações de juízes no Brasil
Por Alvaro Henrique dos Santos 
Com o processo de redemocratização, abriram-se janelas de oportunidades para setores antes invisibilizados. Partindo desse contexto, viu-se a necessidade de reformas no Poder Judiciário que dialogasse com a realidade que o país estava vivendo, a magistratura reconhecia essa necessidade porém uma parcela dividiram-se entre  uma reforma “racionalizadora”, baseada na “regra da lei”, e outra apoiava uma reforma “democratizadora” a fim de incentivar a pluralidade na magistratura e o acesso à justiça. Esse ambiente incentivou a  politização da magistratura, assim estabeleceram-se associações no campo jurídico com a finalidade de incentivar a independência do Poder Judiciário e defender os interesses da categoria, caracterizando-se como associações corporativistas, mas também foram criadas associações com seus ideais pautados numa democracia pluralista e nos direitos humanos, definindo novos tipos de associativismo.
Um exemplo desse modelo de associação corporativista é a Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE), que surgiu em 1972 e desde então representa uma das associações mais importantes pois concentra desde desembargadores de tribunais regionais até ministros do STF, onde observa-se que sua atuação se pauta mais na defesa dos interesses da categoria que na qualidade do serviço jurídico do país, o que é, teoricamente, um de seus maiores “ideais”. Em contraponto, pode-se citar a Associação Juízes para a Democracia (AJD), que surgiu em 1991, pautando-se na efetivação de uma democracia plural e inclusiva para a sociedade e Poder Judiciário, o que caracteriza um diferente tipo de associativismo.
Por mais que as discussões sobre as reformas do Poder Judiciário avançaram, resultando em uma “reforma” em 2004, a Lei Orgânica da Magistratura, de 1979, permanece prevalecendo até os dias atuais, ou seja, até que ponto tivemos uma efetiva mudança no Poder Judiciário? A AJD, uma das poucas associações de cunho mais progressista, pauta isso em sua atuação, inclusive defendendo a adoção de cotas raciais em concursos públicos para juízes, incentivando a pluralidade ao corpo do Poder Judiciário, que pouco se modificou ao longo dos anos. Vale ressaltar o viés ideológico predominante no Poder Judiciário, pode-se afirmar que o conservadorismo e elitismo ainda persistem neste Poder e muitas vezes juízes se posicionam de forma mais progressista, seja por sentenças ou manifestações, acabam sofrendo retaliações. Nas últimas eleições, pode-se observar claramente como a politização de juízes foi cerceada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que proibiu a manifestação de magistrados pelas redes sociais, principalmente no segundo turno das eleições sob um contexto de extrema polarização política, o que caracteriza uma clara afronta ao direito de liberdade de expressão. Muitas associações se manifestaram contra essa medida, mas por ela acarretar diretamente nas liberdades individuais dos juízes.
Poucas associações de magistrados, de fato, se comprometem em atuar no campo democrático, uma atuação que contemple diversos setores e grupos sociais. Aqui, a AJD aparece como uma das associações que representa uma atuação mais comprometida com a sociedade, não se restringindo a atuar para atender os interesses da categoria mas também pelos ideais que a fundou. Nota-se que no país as associações de magistrados são extremamente corporativistas, assim a AJD se caracteriza como um associativismo, vai a campo, busca contemplar os demais setores da sociedades, luta por um Poder Judiciário mais democrático e inclusivo e por uma democracia pluralista, possivelmente as demais associações tem ali alguns exemplos a serem seguidos, ou pelo menos um deles: menos corporativismo, mais direito.
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