Tumgik
#dancingqueensseries
madneocity-universe · 2 years
Text
Tumblr media
Avisos: bullying, palavrões, e adolescentes sendo adolescentes insuportáveis e cruéis.
2 B A D D I E S
ANTES
Um rastro de fogo e ódio é deixado por Alexandra desde o momento em que deixou a propriedade da academia, e dirigiu até o outro lado da cidade até o Conservatório Montgomery. As chaves do carro em uma mão, e a autorização de Damian na outra, a qual ela já tinha assinado e assegurado ele que tudo bem, dar as costas pra própria mãe e desconsiderar todo o cuidado que aquela decisão carregava, ele podia, sim, ir pra escola rival e brincar de estrela no palco sob o selo deles.
Sem problemas, imagina, se ele quisesse, ela até ergueria um banner com a cara dele e a da cadela da Ji Montgomery no centro, e ela não ia se importar. Ele era seu filho, e não podia controlá-lo, mas tinha outra pessoa que ela podia atacar, e nada ia impedir ela.
— A senhora marcou hora com a Sra. Montgomery?
Nem a porra da secretaria do lado de fora daquela sala de vidro fosco, brega pra cacete, diga-se de passagem.
— Não, mas agora sou mãe de aluno, e tenho certeza que essa vadia-... que a Sra. Montgomery pode me atender, se você disser que é urgente.
Alexandra espera pacientemente a garota colocar o telefone no ouvido, e sabe que ela não está ligando de verdade, mas ainda assim finge não perceber, porque sabe que vai acabar pegando a cabeça dela e acertando contra aquela mesa.
— A Sra. Montgomery…
— É uma mulher morta, então já pode chamar a polícia.
Ji tinha ouvido toda a comoção do outro lado da porta, e quando Alexandra invadiu sua sala, o dedo já estava em cima do botão do pânico debaixo da mesa, mas ela devia saber que aquela mulher tinha parte com o demônio.
— Tira sua mão daí, agora mesmo, e vamos conversar sobre você ter sequestrado o meu filho pro seu conservatório idiota!
— Eu não sequestrei ele! Foi você quem trancou a bolsa dele e deixou ele disponível, se não fosse eu, qualquer outro lugar ia ter acolhido ele.
— Qualquer outro lugar, mas por que precisava ser você?
A rixa entre as duas era tão antiga que às vezes, quando questionadas, elas fingiam nem se lembrar, mas dava pra ver e sentir na maneira em que as duas já pareciam estar entrando em combustão em menos de cinco minutos de conversa. Não era só sobre Damian, muito menos sobre Ji ter praticamente o procurado quando soube que ele tinha sido desligado da academia. Tinha muito mais.
— Ele é bom, muito bom, e você sabe que depois que o Day e a Ianthe foram pra faculdade, eu fiquei limitada com as minhas opções e… Ando passando por uma crise de alunos nas últimas audições. Eles vão embora, com honras, mas não consigo achar pessoas suficientes pra completar os lugares. — O tom de Ji era sincero, enquanto se acomodava mais na própria cadeira e observava a mulher, ainda com todas as veias do corpo saltadas e pronta pra avançar nela, em sua frente. — O Damian vai ser uma adição muito, muito expressiva, e vai pelo menos garantir nossos solos masculinos, ele acha que dá conta de fazer sozinho, então entramos em um acordo.
— Tranquei a bolsa dele por um motivo. Ele não sabe mais separar o que ele gosta do que é competitivo, e está usando isso pra mascarar a dor dele e machucando ele mesmo no processo. Ele não precisa sentir que é o líder ou que pode conseguir vencer competições agora, ele precisa de uma pausa, precisa pensar. Ele precisa descansar. — Alexandra então toma o lugar de uma das cadeiras, suspirando ao escolher se queria ter essa conversa ou não com Ji Montgomery. — Tem sido um ano difícil, tanto pra família quanto pra Academia, e eu esperava que o conselho e todos vocês, em volta, fossem mais compreensivos e não saíssem por aí coagindo meus alunos a deixar aquele lugar!
— Foi, literalmente, um aluno!
— Você não está sendo justa e sabe disso!
A secretária de Ji para na porta quando as duas ficam exaltadas de novo, então Alexandra escolhe não a matar. Hoje.
— Eu sinto muito pelas suas perdas e as vagas que não consegue preencher, mas, Ji… Eu te imploro. Competir agora não vai ajudar ele, e nem você, e por mais injusto que essa balança pareça, estamos falando de crianças. Da minha criança. — Alexandra apoia a papelada em cima da mesa, sentindo a mão tremer enquanto Ji a olha de maneira quase inexpressiva.
— E eu sinto pela sua mãe, e pela Jamie, e sei que a Academia Moon tem passado por esse luto duplo e doloroso sozinha, mas aqui, nossos alunos são os únicos que podem dizer o que acham melhor pra si mesmos, e eu não mando no Damian. Ele fez um teste, ele fez uma prova, ele teve a única pontuação máxima da temporada de audições e ganhou uma vaga por mérito dele. Ele trabalhou duro, ele merece. — Montgomery explica pra ela, as mãos juntas em cima da mesa, mantendo o tom firme a postura reta, como se, nem vinte minutos atrás, estivesse pensando que ia ser melhor se jogar da janela do que apanhar daquela mulher. — Como mãe, eu não julgo você, então a decisão de não assinar como a responsável legal dele, é sua.
— Não vou fazer isso com ele.
— Então nossa conversa termina aqui. As aulas dele começam na segunda, certifique-se que ele esteja aqui com a lista de pertences obrigatórios que mandamos por e-mail. — Ji tomba a cabeça pro lado, sorrindo pra Alexandra, quando os seguranças aparecem na porta afim de escoltar ela pra fora. — Foi um prazer recebê-la, Sra. Donovan. O Conservatório Montgomery agradece sua colaboração.
DEPOIS
Na frente da sala, Alexandra expõe todas as fotos de ID dos alunos num holograma enorme, pra toda classe conferir as próprias pontuações. O sistema era muito simples, se você conseguisse um bom rendimento na parte teórica, prática e ainda mantivesse seu compromisso quanto às regras da Academia, tinha mais chances de ter autonomia pra opinar onde ia ser ativo na próxima competição. Solos eram conversados, duplas e grupos também, mas você tinha que ter uma ficha azul e limpa pra se tornar um Royal e poder escolher a própria rotina, e onde quer estar, fim de semana pós fim de semana, até o nacional.
— Ela nem disfarça mais o fato de você ser o único com uma pontuação dessas. — Mia murmura ao lado do irmão, soltando um suspiro ao ver o rosto de seu gêmeo estampado no topo da lista de pessoas que atribuíam ao mesmo estilo dele, já que a separação de gênero não existia. — Ela colocou até uma faixa dourada.
— Ela acha que não promove violência assim, mas tô sentindo pelo menos seis pares de olhos fumegante, bem atrás das minhas costas. — Harvey responde, com um sorriso forçado, mas quando a mais jovem se vira discretamente pra trás, a única pessoa com buracos nas costas era ela. C.J Han a olha como se fosse capaz de explodir ela com a força do pensamento, e Mia só entende quando Harvey a cutuca de lado, e ela se depara com o próprio rosto, no topo do ballet contemporâneo e jazz, com uma faixa igual a de Harvey. — Bom, parece que somos todos dourados agora, não é? Os merdinhas dourados e favoritos pro próximo fim de semana.
Quando Mia sai da sala, Harvey já estava muito na frente dela, sorrindo pro próprio telefone a deixando sozinha no corredor enorme, e por mais que ela conhecesse todos ali e fosse querida pela maior parte dos colegas e professores, ainda se sente absolutamente solitário andar em linha reta com a bolsa pendurada no ombro, e ainda tendo que ouvir a voz irritante de C.J Han num comentário tão maldoso que a fez querer vomitar.
— Todos nós sabemos que eu sou a melhor, não importa o estilo, mas tudo bem, porque não vai ser difícil pisar naquela porca gorda e surda do conservatório. — A loira dizia em um tom quase alegre, com as amigas, pelo menos meia dúzia de cada lado, soltando risadinha e a incentivando a armar um palco pra si mesma. — Porque é isso que ela é. Uma surda lenta e burra.
Mia sente as mãos se fechando em punhos quando vira o corredor, mas pela primeira vez em quase dois meses, ela é a solista da rotina, e não quer jogar isso fora com desperdícios de tempo e projetos de pessoas como C.J Han.
Um dia. Ela promete pra si mesma. Um dia.
Damian acha que já está cinco minutos chamando por Hana na porta da sala de ensaio, e a maneira como ela parece despreocupada fazendo o dever de casa, faz ele acreditar que nem em um milhão de anos ela o escutaria.
Ela não quer, e ela escolhe não escutar, e é uma das coisas que ele mais ama sobre ela, e o que tinha conectado os dois como os melhores amigos. Por isso, quando ele fica na frente dela e aponta pro aparelho auditivo, ela sorri ao cruzar os braços, dando de ombros como se perguntasse o que ele quer, e ele solta uma risada, procurando no fundo da mente todas as aulas de libras que teve na vida pra conseguir falar com ela.
— Ji soltou a lista de solistas, e eu sei que você já sabe o resultado, mas queria avisar mesmo assim. — Ele acha que troca pelo menos dois gestos por cachorro, ou biscoito, mas a expressão no rosto de Hana é de pura admiração e respeito por ele ter tentado e não insistido pra ela ligar os aparelhos auditivos, mas ela faz mesmo assim, erguendo as mãos pro alto logo depois, pedindo silenciosamente pra que ele a ajudasse a levantar.
— Você está melhorando, mas da próxima vez que chamar minha mãe de cadela…
— Eu o que?
Ela aperta as mãos dele nas suas, segurando uma risada quando ele parece atordoado, e se deixa sorrir ao pegar a mochila e os pertences espalhados no chão.
— É brincadeira. — Hana se volta pra ele, que respira aliviado, incapaz de ficar bravo com ela. — Mas eu já te falei pra ser mais articulado, parece uma porta, e se não usar suas expressões faciais, não tenho como saber o que você quer mesmo.
Damian faz anotações mentais quando ela liga os braços dos dois e os guia pra fora da sala, e a sente recuar contra ele quando o barulho do corredor recebe os dois. Alunos super animados com as pontuações e professores compartilhando ideias pras próximas rotinas, e ele só entendia porque Hana preferia mil vezes desligar os aparelhos e ficar alheia mesmo que por um tempo.
Era tudo demais, confusão demais, e incomodava muito, e o único jeito que encontrava de acolher ela naqueles momentos era a segurando perto e andando rápido pra passar por toda aquela onda de pessoas existindo ao mesmo tempo.
Ele sente cada notificação vibrando no celular no bolso de trás, mesmo sabendo quem era, mas escolhe ignorar enquanto tira a melhor amiga dali e guia os dois pra janela enorme no último andar do prédio, a que dava vista pra cidade toda, é um monte de alunos podia jurar que conseguia ver as outras academias e conservatórios dali. Era tranquilo, silencioso, o sol conseguia passar pelo vidro sem dificuldade e Hana amava grudar o nariz sob a superfície e o incentivar a fazer o mesmo.
— Como um mundo tão bonito pode ser tão caótico e cheio de pessoas barulhentas assim? — A mais baixa pergunta com um beicinho, as mãos abertas em cada lado da cabeça.
— Eu não sei, mas também queria saber. — Ele responde, imitando a posição dela, e não precisa olhar pro lado e saber que ela estava fazendo careta. Sua avó ia amar ela, e concordar com tudo também. Mas não tinha tempo pra pensar nisso agora.
Mais uma temporada tinha começado, e pelas próximas semanas, seu único foco era trazer um troféu por final de semana, e não estava disposto a se contentar com segundos lugares.
2 notes · View notes
madneocity-universe · 2 years
Text
Tumblr media
G O D 'S M E N U
Tudo acontece, tão, tão rápido. Harvey acha que vai sufocar.
Damian está na frente dele, dizendo que não importa quem ganhou o Nacional, confessando sentimentos por ele, contando que se sentia frustrado e perdido e era por isso que tudo aquilo tinha acontecido. Ele diz que a culpa não é dele, Harvey, mas sim dele mesmo.
Mas Damian não sabe, Harvey nem mesmo sabe se quer dizer a ele o que aconteceu depois que eles se desentenderam, meses atrás, num corredor caótico como aquele, mas ele perde todo o foco no rapaz e segue a irmã com o olhar.
Mia parece furiosa, marchando pelo corredor, uma das sapatilhas de ponta na mão parecendo pronta pra ser arremessada, e então o caos se instala.
— Ei, CJ! Sua otária do caralho, eu tô falando com você!
E foi o começo do fim pra muita coisa. Tudo em um piscar de olhos.
Alexandra não diz, mas depois que Damian decidiu seguir o próprio caminho e não dar a mínima pro que os pais achavam, ela está preocupada. Kyoya está longe, Connor diz que não volta pras aulas nem se estiver amarrado e quase se mudou pro porão dos Yagami um dia, quando foi ameaçado a ser arrastado pelos cabelos pela própria mãe.
Ela acha que pela primeira vez em quase vinte anos, não vai ter uma pessoa à altura do que ela quer naquelas audições, e ela tem certeza que Ji Montgomery vai a humilhar pelos próximos seis meses se ela não dar logo um jeito, mas todos parecem rígidos, sem vida, mecânicos. Não tem nada de impressionante nos meninos solistas daquela sala, e ela sente vontade de obrigar as mães deles a enviá-los direto pro útero pra ver se deixaram a paixão por lá quando tinham nascido. Ela acha que é o fim da linha pra ela, até os gêmeos chegarem, e apresentarem a melhor rotina de dupla que ela já tinha visto.
Era melhor do que todas as que ela mesma já tinha feito. Era melhor do que Connor e Nell quando eles dançavam juntos. Mas ela não tem interesse em duos, ela quer pessoas individuais e que podem incendiar os palcos sozinhas.
— Eu acho que vai ser uma ótima oportunidade pra testar coisas novas. — Harvey é o primeiro a falar, coçando a cabeça, sem realmente entender o que aquela reunião na sala de Mrs. Donovan significava. — Eu nunca fui solista antes.
— Você nunca foi solista porque nós sempre fomos uma dupla. — Mia rebate ao lado dele, jogando os braços no ar, sem acreditar que a proposta daquela mulher, que costumava ser sua ídola, era separar os dois porque ela tinha uma rinha de escolas de dança pra vencer. — Não acredito que está mesmo cogitando me deixar, nos deixar, porque você acha que vai ser uma boa oportunidade! Nós somos dois, sempre fomos.
Alexandra fica em silêncio enquanto os dois começam a discutir entre si, parte porque sempre foi uma apoiadora do caos e telespectadora fiel de todo e qualquer tipo de briga, e parte porque ela já sabia como ia terminar.
Até porque, a última palavra era sempre a dela.
— Pensem quando forem fazer testes para companhias no futuro. Só existem testes solos, e vai ser uma ótima base pra vocês se começarem agora. — A mais velha tenta contornar, e consegue ver os olhos do rapaz brilhando, mas a garota parece quase ofendida.
— E o que leva a senhora acreditar que nós queremos fazer isso pelo resto da vida, e ainda sozinhos?
O silêncio de Harvey faz Mia se sentir não só traída, mas atacada, porque ele não só não diz nada, como continua olhando pra Alexandra como se a irmã não estivesse ao seu lado, suplicando por qualquer tipo de apoio, e que ele não a deixasse sozinha. Mais uma vez.
Mia deixa a sala um minuto depois, e Harvey até sente vontade de ir atrás dela, mas é egoísta demais pra não pensar em si mesma quando a própria Alexandra Moon começa a encher seus olhos com todo o papel importante que ele ia desempenhar dali em diante. Ser uma promessa ao lado da irmã, era muito bom, mas ser uma promessa encontrada pela pessoa que ele mais admirava no mundo, era ainda melhor. Ele ia fazer tudo que ela dissesse pra ele fazer, porque tinha esperado uma vida inteira, e aquela era a oportunidade que milhares de pessoas se matariam pra ter.
— Então… — Ele suspira, os ombros encolhidos como quem não queria nada, mas o sorriso no rosto era tão ambicioso quanto o da mulher sentada no outro lado da mesa. — Você vai fazer de mim o seu substituto perfeito?
A cada final de semana sendo preenchido com um troféu grande levado pra academia e mais uma matéria prestigiando o curso, Harvey deixava de ser o substituto, e se tornava apenas perfeito. Ele era perfeito aos olhos dos professores, aos olhos dos instrutores, e mesmo os colegas não conseguiam sentir raiva dele, quando tudo o que ele fazia era sorrir e oferecer gentilezas enquanto tirava qualquer chance deles subirem no ranking e ficarem com as rotinas dele. Ele era bom no que ele fazia, ele sabia onde precisava melhorar e o que podia fazer pra impressionar, e vinha se tornando uma ameaça pra todos os outros estúdios da cidade, via seu nome correndo pelo estado só dois meses antes do nacional.
Ele era o centro de todas as atenções, e gostava de se gabar até demais disso.
— Sua mãe fez uma pirâmide de A4, um dia desses, com as fotos de todo mundo na minha categoria, e claro, eu estava no topo e ela continuava dizendo que era uma vergonha ninguém tentar escalar as posições e chutar a minha bunda magrela de lá. — Ele comentava com um sorrisinho insolente, observando Damian rolar os olhos com força pela tela do celular, um hábito que ele tinha adotado em cada atualização que recebia da academia. — Foi divertido, e pelo menos ela não acerta mais o seu rosto com flechas.
— E sua bunda não é magrela, posso dizer com segurança.
Harvey sente o rosto esquentar só um pouco, quando ouve aquela declaração e vê a maneira como Donovan sorri pra ele. Devia ter medo do quanto ele se sentia afetado, mas não conseguia evitar.
No momento, eles não tinham um rótulo e nem falavam sobre o que eles eram de verdade, mas concordavam que eles gostavam daquilo: a maneira como eles se provocavam o tempo todo, se enfrentavam nos palcos todo final de semana, e terminavam dando amassos alucinantes em salas vazias, estacionamentos e o banco de trás do carro de quem estivesse disponível, quando eles não tinham paciência pra chegar até o lugar onde tinham combinado de ter um date… Decente. Não parecia segredo pros colegas de nem uma das academias, mas não era como se eles ficassem de mãos dadas por aí também. Era a primeira vez que ficava tanto tempo com a mesma pessoa, menina ou menino. Era o jeito deles, e funcionava.
Harvey estava feliz, e acreditava que Damian também, e era o que importava.
Ele pelo menos pensava que importava, quando entrou no corredor de camarins, um buquê de flores nos braços pelo segundo lugar que ele não tinha ligado de pegar, já que o primeiro tinha sido de Donovan, e estava muito pronto pra alcançá-lo no final da linha e beijá-lo e abraçá-lo e dizer que tudo bem, ele realmente tinha o superado, e que eles podiam até comemorar. Uma menina já tinha os braços ao redor do pescoço dele, e ele até a levantou do chão enquanto eles se abraçavam, pareciam um desses casais de dorama que ele e os primos costumavam ver nas reuniões de família só pra rir e comentar as produções ridículas. Damian e aquela garota, definitivamente, tinham saído de um dorama, e porra, ele só queria ter sido avisado que era o antagonista com ar de vilão que estava tentando separar o casal em segundo plano.
Cacete, ele só queria ser avisado que não passava de um passatempo na vida daquele hetero ridiculamente gostoso e material de namorado, então não ia se iludir.
— Harvey, espera!
Lee até pensa em se virar no estacionamento, mas estava segurando lágrimas, LÁGRIMAS, depois de sair do caos daquele prédio de competição pra ar noturno do estacionamento. Se o troféu não estivesse aos cuidados dos colegas, ia ter chutado ele o caminho todo, e até usado pra acertar a cara linda daquele desgraçado quando ele se virou, puto, pra ele.
— O que você quer?
Donovan volta um, dois passos, quando nota o tom baixo e sério do outro garoto, tão perdido que nem consegue disfarçar. Quase inocente.
— Eu pensei que nós íamos sair, disse que a gente ia se encontrar, e depois…
— E depois o que? Por que não volta pra sua vida e me deixa em paz?
— Do que você tá falando?
— Eu tenho direito de escolher fazer parte dessa merda e, porra, Damian! A resposta é não! Não quero nada com você, não hoje, não amanhã, e nem nunca. Então, por favor, se tem alguma consideração, só volte pra sua vida, e me deixe em paz.
Damian fica lá, parado e atordoado e sem saber o que fazer. Congelado mesmo depois que o carro de Harvey sai do estacionamento e some pela rodovia, não faz a mínima ideia do que acabou de acontecer, e nem porque o peito parece ter sido atingindo por um soco; muito menos que Harvey, chorando e ficando triste enquanto dirigia pra casa, se sente do mesmo jeito.
Harvey acha que pode ficar na sauna por dias, e costumava se gabar muito no colégio por ter acesso aquilo na outra escola que frequentava, sobre como a St. Judes não valia o sacrifício de ele continuar se mantendo em duas escolas, quando a academia fazia mais valer os milhares de dólares que os pais tinham investido nele e na irmã só naquele semestre.
Ele sente que pode ficar ali, jogado e derretendo, ficando triste e deprimido por aquele coração partido, e nada vai ser melhor ou se comparar. Nem assistir as brigas no pátio, nem acompanhar as fofocas do ensino médio. Ele só precisa ficar ali, sozinho e…
— Problemas no paraíso?
Esperar CJ Han acontecer na vida dele também. Sabe, ela era uma figura. Sabia que ela era mais velha e já estava, palavras dos instrutores e não dele, fazendo hora extra entre os alunos, porque sempre que ela parecia engatar em uma companhia, voltava pra estaca zero na academia mesmo que fosse muito talentosa. O que ele sabia dela, era que vinha travando uma verdadeira batalha acirrada com Mia pelos solos, e o que ele sabe agora, é que acha ela atraente sem toda aquela maquiagem, e que vapor e cabelo úmido caem bem nela, e que aquela toalha, podia cair a qualquer momento, com a maneira com que ela anda na direção dele e o analisa dos pés a cabeça e ele quase esqueceu como responder.
— Eu não…
— Você e o Damian, nosso desertor favorito. — A loira se adianta, piscando os cílios enormes de maneira inocente, ao se inclinar na direção dele a apoiar as mãos no assento em que ele estava, uma mão de cada lado, só centímetros de encostar o corpo dela com o seu. — Você passava o dia todo falando com ele, e agora anda por aí como se fosse um homem condenado à morte. Parecem problemas no paraíso pra mim.
— Ficou me observando o tempo todo? — Harvey sabe que devia achar aquilo demais, mas tem uma visão fantástica da curva dos seios dela dali, e não tem nada na cabeça de cima, enquanto a debaixo já cutuca a toalha de maneira ansiosa.
— Esperando o momento perfeito, e torcendo pra brincadeira de casinha de vocês dois acabar logo. — Ela murmura, prendendo o lábio inferior nos dentes, antes de soltar uma risadinha. — Mas você ainda não me disse. Como está o paraíso, Harvey?
Ele pensa em Damian, na garota do corredor, por que ele acha que já a viu antes? E por que não foi lá e enfrentou os dois ao invés de sair correndo? Por que ele não lê as mensagens dele e nem atende os telefonemas dele? Ele era injusto por não deixar ele falar, ele ia ser um idiota se deixasse ele explicar e ainda expor que sim, tinha sido tudo uma experiência e ele não se importava? O que tinha acontecido naquela noite, de verdade?
Mas ele também pensa que nada mais importa, e que não precisa se preocupar. Não quando tem a maior de todas as oportunidades bem na frente dele, pronta pra fazer ele esquecer, e esvaziar a cabeça de uma vez por todas.
— Eu tenho certeza que dentro da sua boca, mas só você pode me provar.
E ele não ia, mesmo, jogar fora.
1 note · View note
madneocity-universe · 2 years
Text
Tumblr media Tumblr media Tumblr media Tumblr media
Get your soldiers, tell 'em that the break is over!
2 BADDIES
GOD'S MENU
BEAUTIFUL MONSTER
MAYDAY
ANTIFRAGILE
YOU SHOULD SEE ME IN A CROWN
NO CELESTIAL
1 note · View note
madneocity-universe · 2 years
Text
Tumblr media
N O C E L E S T I A L
LOS ANGELES, 2018.
Alexandra sente que se não fizer algo, vai se arrepender pro resto da vida, e que se for mesmo viver tanto mesmo com Ethan debaixo do mesmo teto que ela, ela definitivamente não quer ficar se lembrando daquele dia: o dia que não foi atrás de Jihyo Lee, depois dela praticamente fugir do palco em que ia competir quando anunciaram seu nome.
Ela tinha conseguido ser a última da lista, era seu último ano competindo entre aquelas pessoas incluindo Moon, como ela tinha coragem de jogar tudo fora? Crise de nervos, ansiedade ou o que fosse, verificou todas as salas do corredor enorme achando muito difícil enxergar com todo aquele glitter colado em seus cílios, e quando finalmente a encontrou, era como uma mãe exigente a puxando pelos ombros pra ficar de pé e se recompor.
— Você deve ser a vadia mais burra que eu já conheci, e olha eu aqui, ajudando você a tentar pegar meu troféu. — Moon reclamou o caminho inteiro, achando patético como a outra soluçava e tentava puxar a mão pra longe da sua.
— O meu pai…
— É só um pai, não pode e não vai te tirar daquele palco, e se ele não ficar feliz depois de te ver… Bom, é melhor não chamar ele mais de pai.
Alexandra para bem atrás das cortinas, então olha pra fileira imensa de pessoas que tinham ido prestigiar Lee como seu fã-clube pessoal e fiel. Ficou feliz por ela ter apoio de alguém, esperava que ela ficasse também, mas não ia admitir isso em voz alta. Nunca. Nunquinha.
— Vamos, Ji. Vá lá e tente, só tente tirar o que é meu, eu vou te esperar bem aqui.
E tudo bem que ela fosse sua nemesis, ela ainda esperaria por ela pra ter certeza de que ela estava bem.
Hana sabe que vai sentir muita falta de Damian, e consegue sentir que ele também vai sentir muita falta dela, e por mais que os dois queiram ser egoístas e simplesmente puxar um lado pra seguir pelos próximos meses, eles sabem que não podem.
— Promete, de dedinho, que não vai se esquecer de mim só porque voltei pra academia da minha mãe e vou voltar a ser seu rival por tabela. — Damian ergue o próprio dedo, esperando a garota mais baixa fazer o mesmo, segurando o tom dramático o máximo que conseguia. — Hana, juro por Deus, se você não me responder…
— E pra quem eu vou contar as fofocas da comunidade coreana e do conservatório? Damian, você é minha alma gêmea e sabe disso! — Ela se defende, então enrolando o dedo mindinho com o dele, e no momento seguinte, eles estão se abraçando como se nunca mais fossem se ver. Como se não tivessem celulares pra mandar mensagem, como se não morassem na mesma cidade.
Pirralhinhos dramáticos e pegajosos, mas ainda assim era uma amizade sincera.
— Por favor, se tiver algum problema, me diga e eu juro que eu vou vir correndo te socorrer, Hana. Você sabe que não está sozinha.
— E você, por favor, sempre que precisar conversar e falar sobre a vida, me procure. Você sabe que eu sempre vou ouvir, Damian.
Ji acha que vai começar a chorar enquanto observa os dois só alguns passos de distância, e Alexandra jura que já está chorando dentro do carro vendo a interação dos dois jovens em cima da calçada.
Nell e Connor II se entreolham no banco de trás, então começam a tecer comentários entre si.
— E ele quer que a gente adivinhe que eles não namoram. — Ela diz, indignada.
— Se eu não tivesse visto coisas que gostaria de desver, eu juro, até acreditava que ele gosta de mulher. — Ele então rebate, ainda mais indignado, e os dois forçam vômito quando veem a dupla começar a soluçar enquanto acenam um pro outro em despedida. Como duas criancinhas se despedindo na caixa de areia no final do verão, mas no fim, só eles iam entender tudo o que tinham vivido nos últimos seis meses.
— Mrs. Montgomery, não quero que o Damian se torne minha Nemesis. — Hana sussurra para Ji quando a mais velha apoia uma mão em seu ombro, e as duas assistem o carro dobrar a esquina e sumir pela rua.
— Tudo bem se ele for, vocês ainda podem se apoiar e se admirar mesmo assim. — E ela a consola, abrindo um sorrisinho no processo. — É mais fácil do que parece, eu juro.
Na sala de Mrs. Donovan, Mia se sente tão leve quanto uma pluma a ouvindo falar que ela tinha sido expulsa pelo conselho, que não podia competir nacionalmente e muito menos internacionalmente, e que mesmo sua permanência em qualquer escola de dança e companhias no futuro era incerta, incluindo a Academia Moon.
— Eu queria comprar a sua briga e dizer pra eles que você só estava se defendendo…
— Mas eles jamais iam acreditar, e tá tudo bem, eu nem quero continuar sendo bailarina mesmo.
A morena dá de ombros no mesmo instante que vê a mulher mais velha ficar chocada, porque a verdade é que queria dizer aquilo fazia muito tempo, e aquela só calhou de ser a oportunidade perfeita.
— Fiz aquilo porque eu quis, sabia quais eram as consequências, me senti bem batendo nela, e se tivesse outra oportunidade, faria de novo. Eu nem conseguiria mentir na cara daqueles velhos e a senhora sabe disso, então é melhor nem reservar esse tempo e esforço, porque ele vai ser desperdiçado. — O tom era honesto e as palavras sinceras, porque depois de uma longa conversa com os pais sobre seu futuro, sentia que devia isso aquela mulher também. — A senhora ainda vai ser uma das minhas maiores inspirações, e eu sinto muito por ter colocado o nome da academia em notícias ruins e ter falhado como uma solista…
— Se você sente que sou mesmo sua influência, já deve saber que eu também não sou a pessoa mais tranquila do mundo, e que teria feito o mesmo que você se estivesse no seu lugar, senhorita Smythe-Lee. — Alexandra a interrompe abrindo um sorriso mínimo, fazendo um esforço pra não sair do papel de adulta responsável e que não tinha feito pior na idade dela, vendo a garota relaxar na cadeira. — Você foi bem, trabalhou duro, entregou o que se propôs e fez o que devia, da melhor maneira possível. Foi um prazer recebê-la e ensiná-la enquanto eu podia, mas… Eu só fiquei curiosa, sobre qual caminho decidiu seguir agora.
Mia contempla as palavras dela por um tempo, os olhos castanhos viajando por toda sala, antes de se voltar a Mrs. Donovan.
— Bom… Vamos só dizer que eu escolhi um outro tipo de palco.
Era um ringue, sendo bem específica, mas ela só soube de verdade depois de passar pelas portas da academia de luta e ver todos aqueles adolescentes e jovens adultos socando sacos de areias ou uns aos outros, bem diante dos olhos dela, e saber de quem pertencia aquele espaço na hora também.
— Você não me disse que seu pai era o Beau Donovan, tipo, Beau Donovan A Besta do MMA.
— Meu nome é literalmente Damian Donovan.
A garota continua espiando tudo o que acontecia ao mesmo tempo atrás do garoto mais alto, que parecia muito confortável naquele lugar pra alguém que passou a vida em estúdios de ballet, mas com certeza passava boa parte do tempo ali também por causa do pai.
— Isso é… Insano. — Ela diz mais pra si mesma, apertando a aula da mochila.
— Você não disse que fez taekwondo quando era criança? — E ele a questiona, batendo o ombro contra o dela, a provocando como se conhecessem a anos, e não desde o dia que ela flagrou ele e o irmão dela dando uns amassos numa sala vazia.
— Eu disse que meu tio obrigou a família toda a fazer taekwondo quando criança. E ainda assim é muito diferente porque eu nunca nem ganhei uma faixa!
— Mas conseguiu destruir a cara de uma garota com o dobro do seu tamanho sem nem suar ou dar uma chance pra ela revidar ou perceber que você ia ser uma praga na vida dela. — Damian então se separa dela, dando passos largos pro meio do ambiente, os braços abertos como se apresentasse todo um universo pra ela. — Mia, eu acho que esse é um lugar perfeito pro seu recomeço.
E a verdade é que ela fica encantada, no sentido mais puro e genuíno da palavra, consegue sentir as mãos tremendo de ansiedade no bom sentido e os pés já se movendo sozinhos pra explorar todo aquele lugar e aprender a fazer o que aquelas pessoas faziam. Talvez ele estivesse certo.
— E você ainda vai me agradecer muito. — Ele diz, parecendo ler os pensamentos dela, ao que ela simplesmente concorda.
— Talvez, um dia.
Harvey observa, bem de longe e da maneira mais discreta que consegue, a volta dos irmãos Donovan pra Academia e como a fofoca do processo judicial de CJ Han não segue mais de maneira sigilosa depois dela confessar tudo que tinha feito, em todas as escolas que já tinha passado, pra quem quisesse ver e ouvir e tivesse um smartphone pra ver as notícias mais rápido.
A essa altura, ele sabe de três coisas: é muito difícil ficar ali sem a irmã e sente falta dela, tomou todas as decisões erradas cedendo a CJ todas as vezes que ela se ofereceu pra ele e ele mesmo se ofereceu pra ela, Hana Park era a garota naquele dia que ele surtou, e depois de compreender que ela não passava de uma amiga para Donovan, se sentiu culpado por pedir ao universo que ela fosse atropelada desde então.
Ele sabe que Damian vai acabar sentindo os olhos dele em suas costas, e quando ele se vira e olha pra ele, dá meia volta em torno de si mesmo e simplesmente sai andando como se não fosse com ele e tivesse alto de muito importante pra fazer. No último dia de aula, quando todo mundo só estava juntando os pertences pra levar pra casa no recesso de inverno pós nacionais.
Nem ele acreditava nisso, e nem Damian, mas não custava tentar.
— Ei…
— Foi mal por achar que você era hetero e tinha uma namorada e ter surtado daquele jeito. — Smythe-Lee começa, enfiando as mãos nos bolsos pra Donovan não ver ele tremendo, não por finalmente conseguir falar com ele depois de tudo, mas porque acha difícil olhar pros olhos dele enquanto faz isso e torce pra que ele não o odeie quando termine seu discurso. — Não faz ideia de quantas vezes passei por isso e eu sei que foi ridículo da minha parte criar todo esse terrorismo na minha cabeça, sem nem falar com você, ou deixar você me explicar… Eu fui um idiota, você não merecia ter ouvido aquilo, e nem precisa aceitar as minhas desculpas, é só que…
— Foi um ano do caralho pra todo mundo e eu mais do que ninguém entende isso, Harvey. — Damian completa, encolhendo os ombros.
— Então, você não me odeia? — Harvey quase acha que é bom demais pra ser verdade, só pra ter as esperanças tiradas dele no mesmo instante.
— Não odeio você, estou apaixonado por você, mas não acho que posso ter um relacionamento agora porque meu ano foi do caralho, e você não foi justo comigo. — O mais novo responde, achando difícil, também, olhar nos olhos dele enquanto diz aquilo. Porque queria beijá-lo, fazer o melhor sexo de reconciliação da vida dos dois, mas tinha responsabilidades com o próprio processo de cura, e não tinha o menor interesse de fazer aquilo com toda a história de CJ tão recente também. — Não quero que você seja minha Nemesis agora que estamos no mesmo lugar.
Harvey fica tão chocado com as palavras dele que quase esquece como se fala e que realmente precisa respondê-lo.
— Eu também estou… Eu também não quero que você seja minha Nemesis agora que voltou.
Vamos Harvey, você consegue. Diga a ele que também está apaixonado por ele, diga a ele que o apoia na decisão de se afastar de você mesmo que isso doa e que entende que ele precisa de ajuda psicológica acima de tudo, diga a ele que sente muito e que gostaria de recomeçar as coisas e que vocês podem ser amigos primeiro de tudo, diga a ele, só diga qualquer coisa.
— Vocês dois não precisam se preocupar em ser a Nemesis um do outro, eu sou o sol que vai destruir os dois. — Connor II comenta, uma mão apoiada em cada ombro dos outros dois garotos, enquanto abre um sorriso enorme. — Vocês sabem disso, não sabem?
Damian tinha até se esquecido do inferno que era ser solista debaixo do mesmo teto que o próprio irmão, e Harvey só quer que aquele cara tenha outra crise de identidade antes que seja obrigado a bater nele, quando Connor deixa os dois ali e sai pelo corredor, mas não sem antes os alertar, mais uma vez, que os dias de paz tinham terminado.
— Espero que o recesso de vocês seja incrível, porque o próximo semestre vai ser do caralho.
Jamie solta um suspiro quando desliga a TV e contempla a parede de riscos atrás dela. Ela agora estava vazia, como se tivesse dado um reset, não porque ela não pertencia mais àquele lugar, mas porque tinha outro pra ir. As luzes piscando em cima de sua cabeça só deixavam claro que estava na hora, e ela não tinha mais tempo pra perder.
Vou sentir falta da comida gratuita, e das roupas sempre meu dispor, de fazer a linha recepcionista de pessoas perdidas no espaço tempo, e de assistir os desfechos como se fosse uma série, mas estou mais cansada agora, cansada demais pra pensar que isso era bom a ponto de eu me importar.
Ela tira o crachá do uniforme de recepcionista, e o deixa por ali, mesmo que não faça diferença, ela quer que as coisas sejam assim, e simplesmente vai pra direção da porta que ela costumava fugir desde que tinha chegado naquele lugar, com o corredor escuro que sempre se mostrava disponível pra ela passar e chegar do outro lado, pra porta iluminada e aberta 24 horas por dia.
Ela está pronta, ela quer isso, ela não só mais precisa ir, como está bem com a ideia de… Bom, ir.
— Por favor, que não seja uma entidade ruim me esperando do outro lado, eu sempre fui tão legal… — Ela sussurra pra si mesma, sentindo um arrepio subir por todo corpo quando uma lufada de ar a atinge assim que ela abre a porta, os olhos tampados com as mãos, com tanto medo do que poderia ver do outro lado.
Até ela conseguir espiar entre os dedos finos, e sentir um alívio sem igual.
— Mrs. Moon!
Ela ia ficar bem, sabia que sim, podia simplesmente deixar aquele lugar e provar por si mesma. Ela não precisava mais do Muro.
1 note · View note
madneocity-universe · 2 years
Text
Tumblr media
YOU SHOULD SEE ME IN A CROWN
Se o patamar da perfeição realmente existe, CJ Han com certeza é a pessoa o habitando e governando como seu melhor espécime. E antes mesmo de aprender a falar, ela já entendia que falhar não era uma opção na família dela.
Crescer a sombra de uma irmã sem defeitos e com pais que exigiam ainda mais dela, a deixou doente antes mesmo dela entender quem ela era, e entender que as coisas não precisavam ser sempre daquele jeito.
— Por que preciso acordar tão cedo, se a escola começa no mesmo horário pra todo mundo? — Sua versão de sete anos questionou a mãe uma vez, observando o céu escuro de Los Angeles pela janela enorme do quarto cor-de-rosa, enquanto a mulher mais velha não parava de puxar seu cabelo e o enrolar no babyliss. — Isso é tão chato…
— Você pode achar chato e ruim agora, e preferir realmente dormir mais, mas um dia vai me agradecer por fazer de você a menina mais arrumada da sua classe, e a aluna mais impecável de todas.
Ter um complexo com a própria aparência e achar que precisava ser sempre sua versão arrumada e alinhada, não era exatamente um motivo que faria CJ agradecer a atenção dos pais quanto a ela, mas tinha coisas piores pra se preocupar.
— Não gosto dessa roupa. Pinica e as sapatilhas estão me machucando e eu só quero ir pra casa. — Ela resmunga com a mãe mais uma vez, agora tinha dez anos, e não via a menor graça em se apresentar em palcos na liga kids. Preferia mil vezes andar de bicicleta, jogar baseball com seu vizinho, e se sentia exausta depois de passar horas repetindo a mesma rotina sem parar. Ela acha que vai começar a chorar, quando a mãe agarrou seu rosto com força e a fez olhar pra ela.
— Sua irmã está passando por coisas muito mais desafiadoras agora mesmo num corpo de ballet de verdade, sabia? E se quiser ser como ela, vai ter que se acostumar com isso aqui, porque é o que você está destinada a fazer, até ser como ela.
A postura da mãe era tão ameaçadora e enorme em comparação ao tamanho sutil dela, que ela não se lembra de ter reclamado outra vez, nos quase treze anos que aquilo se estendeu. Era sobre ter uma vida inteira dedicada a orgulhar pessoas que diziam a amar, suficiente pra que as mesmas lhe dessem atenção e carinho e reconhecessem o quanto ela trabalhava duro, mas era tão difícil ver os outros a superando quando ela parecia tão perto de ter resultados, tão difícil se sentar lá e fingir que estava feliz por eles, até dizerem pra ela que ela não precisava, e não devia se contentar com pouco.
— Você tem que lutar pelo que é seu, defender o seu lugar como uma leoa, devorar todos os seus inimigos se for preciso. Porque é isso que eles são, são seus inimigos, e todos eles são uma ameaça que você tem que exterminar e fazer se arrepender de ter cruzado o seu caminho. — A irmã dizia, num tom tão duro e frio quanto os pais uma vez tinha feito aquele discurso pra ela, e CJ só soube que era assim que as coisas tinham que ser.
Não bastava ser bonita e talentosa ou ter carisma, precisava ter algo que as pessoas jamais esperariam dela.
Precisava ser o próprio caos, um milagre ruim.
Quando anunciam que ela teve a pontuação máxima na última competição do ano, Han desvia de cada um dos participantes que se dirigem até ela para parabenizá-la, e só tem olhos pro troféu enorme que o apresentador está segurando na frente dela. Os pais estão vibrando em seus lugares na primeira fila, enquanto ela ergue aquela estrutura de metal pesada, e não dá mínima quando Mia e Hana, respectivamente, têm seus segundo e terceiro lugar anunciados. Aquele momento era seu, e ninguém iria tirar aquilo dela.
— Você foi bem lá. — Mia murmura pra ela, meio sem interesse, mas ainda assim em um tom educado quando Han se aproxima da sala cedida pra academia no corredor. — Parabéns.
— Eu não preciso do seu reconhecimento, lindinha. Não é como se você estivesse surpresa, não é? Não depois daquelas apresentações horríveis. — A loira comenta, sem nem se importar que a maior parte dos jovens que estavam competindo naquela noite, estavam no mesmo espaço que elas, ouvindo tudo. — Nem uma de vocês teve a menor chance e quanto mais rápido vocês todas entenderem, melhor vai ser.
— Bom, eu não sei. É você a adulta que não consegue segurar uma vaga em uma companhia, e precisa competir com meninas do ensino médio pra ter algum sentido na sua vida e não aceitar que é uma fracassada. — Smythe-Lee solta uma risada no meio do comentário, se divertindo com a maneira como começa a fuzilar ela com o olhar. — Como se sente com chances cada vez mais limitadas?
CJ aperta o troféu nas mãos, e pensa em usar ele pra abrir um buraco na cabeça de Mia, e nem mesmo o corredor cheio a impede de pensar que ia ser muito fácil, preferindo fazer o que ela sabia de melhor.
Destilar ódio e veneno.
— Eu não vou perder meu tempo com uma vadia desesperada por atenção e sexo igual a você. — A loira começa, sabendo que tinha tocado em um ponto, quando viu a mais jovem congelar diante dela. — Tão fácil de levar, sempre com as pernas abertas e pronta pra dar pra qualquer pessoa que ache você bonita, assim como seu irmão, que não pensou duas vezes em me botar pra mamar enquanto chorava pelo viadinho do Damian. É assim que vocês conseguiram tudo? Oferecendo todos os buracos do corpo pras pessoas importantes de verdade… Ou nem isso faz com que gostem de vocês?
Ela não espera nem um segundo antes de jogar um beijinho no ar pra ela, e andar até Hana Park no final do corredor, que nem parecia ter ficado em terceiro lugar com a quantidade de pessoas já a bajulando. Aquilo só deixa ela ainda mais brava e enciumada, mas não suficiente pra perder a oportunidade de esfregar seu mérito no rosto daquela menina minúscula.
— Ah, porquinha, achei que você já tinha ido pra casa sem se despedir de mim. — Han comenta, não dando a mínima pro quão tensas as meninas estavam na presença dela. — Eu só queria que você soubesse…
A voz enfurecida de Mia soa bem atrás dela, e ela precisa se virar no mesmo instante pra entender o que está acontecendo. Até acontecer.
Quando ela se vira pro corredor, é recebida pelo primeiro dos quatro golpes que Mia mira direto no rosto dela, acertando o nariz com a parte de gesso da sapatilha e CJ jura que consegue ouvir ele se quebrando e os pedaços se mexendo debaixo da pele quando a mais jovem a atinge de novo, de novo e de novo, até ela se desequilibrar e cair no chão.
Dói tanto, sangra tanto, e ela quer chorar mas não consegue, porque o ar é bloqueado em sua garganta quando Smythe-Lee se ergue sobre ela; uma perna dobrada no chão enquanto a outra faz força com o pé sob a garganta de Han, que tem o olhar mais aterrorizado de todos observando aquela menina parecer tão tranquila enquanto atenta contra a vida dela.
— Eu juro por Deus que se ouvir meu nome ou de qualquer outra pessoa perto de mim, sair pela sua boca imunda, vou quebrar a sua cara com mais força ainda e acabar com a sua raça. — A morena ainda tem a pressão persistente em cima dela, a prensando pra baixo, no chão sujo, onde ela pertencia, enquanto aponta a sapatilha ensanguentada pra ela. — Não é uma ameaça, é um aviso. Você é uma vadia psicopata do caralho, mas eu juro que posso ser ainda mais louca que você.
Harvey e Damian aparecem em seu campo de visão removendo a garota que a tinha atacado ali, e mesmo quando ela está de pé e as amigas de CJ se juntam a sua figura desfigurada e encolhida no chão, uma não tira o olhar da outra, e a loira jura que nunca vai esquecer do medo que sentiu naquele dia, e nem o quão mortal aquela garota parecia.
Na sala de Mrs. Donovan entre os pais, ela se recusa a admitir isso ou concordar quando os dois adultos falam que agora ela não tem paz pra estudar, que se sente ameaçada e exposta, e que tem medo daquela delinquente repugnante. CJ sempre foi a valentona, nunca a vítima, e não era uma rata insignificante como Mia Smythe-Lee, que resolveu voar alto demais, que ia tirar isso dela.
Ela tinha uma coroa pra manter, e ia defender ela até o fim com o único propósito de ser a maior.
— Os pais daquela garota não dão a mínima sobre como nossa filha se sente. — A mãe é a primeira a apontar, uma mão apoiada no ombro da loira, a outra apontando um dedo na direção de Donovan. — Eles acham que pagar pelos gastos médicos e psicológicos vai ser suficiente?
— Na verdade, foi um acordo bastante justo, ainda mais agora que o caso foi pro conselho e não parece que eles têm intenção de absorver a Mia da decisão de proibir ela de competir em solo nacional, o que ela concorda e promete ser paciente e respeitosa com qualquer que seja o final da análise. — Alexandra comenta, tentando manter a calma e não parecer tão cínica quanto soa em sua cabeça, quando abre um sorriso mínimo pro casal. — Mas por que a gente não fala do histórico de comportamento da CJ? O conselho é muito rígido com dança competitiva, e as fichas de ética e bom comportamento é o pilar de continuidade da carreira de alguém no nosso meio. Então, quando iam nos contar que a CJ tem um 5, numa escala de 1 a 5, e que ela não é mais apta pra estar numa escola dessas, e muito menos competir?
O casal fica em silêncio, e CJ também, então Alexandra escolhe se aprofundar mais no assunto que tinha agora em mãos, tão físico e presente quanto o histórico de Han, acumulado de todas as outras academias que ela frequentou desde criança antes dali.
— Bullying, perseguição, agressão verbal e psicológica. Ninguém com um 5 devia ser aceito em qualquer estúdio ou conservatório ou academia, então vocês resolveram omitir todas essas informações e jogar a filha de vocês aqui como se ela fosse um anjo, e não uma bomba pronta pra explodir nos meus alunos. — A mulher continua, e quando mais uma vez eles não tem uma resposta, ela continua, se voltando a garota no meio deles. — Eu liguei pras companhias que ajudamos você, CJ, a entrar nos últimos semestres, e todas elas te mandaram de volta porque você apresentava uma ameaça a integridade emocional e física dos seus colegas. Quando você ia contar que tinha sido chutada, e não voltado por que não se adaptou a vida de bailarina profissional?
CJ quer sorrir quando Alexandra direciona aquela pergunta pra ela, mas o rosto dói tanto, e os curativos no nariz não estavam fazendo o mínimo pra ela conseguir mexer o rosto sem sentir ainda mais dor, então ela segue olhando pra janela atrás de Alexandra, fingindo não se sentir atacada.
— Nós falamos com a mãe da Hana Park, e depois das nacionais, ela parece decidida a levar o caso de intimidação constante pra polícia. A filha de vocês disse pra uma garota deficiente que ela nunca vai ser capaz de ser tão boa quanto ela, porque ela é surda. Uma porca gorda e surda. — Alexandra sente um gosto amargo na boca ao recitar as palavras da própria CJ, vendo os pais dela se focarem na própria filha, antes de continuar. — Então considerem a ajuda dos pais da Mia Smythe-Lee um milagre, porque as coisas não vão ser fáceis pra vocês daqui pra frente, e essa academia não tem a menor intenção de proteger a filha de vocês durante o caminho. A Academia Moon vai cortar todas as relações com você, CJ, e esperamos que você entenda o grau da situação e como nós decidimos isso. Nós não vamos comprar a sua briga.
A sala se torna um caos. Os pais de CJ querem que Hana Park seja processada por inventar mentiras, querem processar as vítimas das companhias porque a filha jamais seria capaz de fazer aquilo, por mais que eles saibam exatamente do que ela é capaz, e cada atitude sua que a levou àquela posição, mas a maneira que eles ainda tentam é divertida, quase hilária pra CJ, que começa a rir por cima da discussão, jogando a cabeça levemente pra trás quando eles param de gritar pra dar atenção a ela.
— Você nunca comprou uma briga minha. Nem um de vocês. Porque vocês nunca tentaram fazer de mim alguém melhor ou maior, e sempre que o semestre virava e vocês abriam as audições de novo, eu era trocada por algum novato nojento e mais jovem que eu. — Han começa a falar, as mãos em cima do colo enquanto brinca com os dedos, ainda soltando risinhos a cada constatação. — Não importava o quanto eu me esforçasse ou desse o meu melhor, ia ser sempre substituída e massacrada por alguém que vocês escolhiam amar e enaltecer e admirar, sempre me esquecendo e que eu estava ali, desesperada por um minuto de atenção, torcendo pra ser notada de novo.
— CJ… — Alexandra solta um suspiro cansado, que faz a mais jovem se levantar com raiva, a cadeira se afastando dela pelo impulso num barulho alto.
— Não, não! Você sabe que é verdade, sabe que não estou mentindo! Eu sempre fui descartável, sempre fui um apoio, e quando tentei tomar a situação do meu jeito, você fala que fui má eles, que fui violenta com eles, mas a verdade é que sou a única que sei o que é melhor pra mim. Sou a única que sabe do quanto sou capaz, e de tudo que precisei fazer pra chegar até aqui.
— CJ, por favor, se acalme. Você não quer ter essa conversa agora. — O pai tenta deter ela, pessoalmente não gostando do tom que a conversa estava levando, deixando Alexandra um tanto confusa e curiosa ao mesmo tempo.
— O que? Vocês também têm pena daquela pobre coitada? Vocês também preferiam ela acima de mim? As coisas só ficaram bem quando a Jaime saiu da minha vida, e eu só fui a estrela quando ela não era mais, e eu só fui importante quando ela deixou de ser. Vocês amavam ela, e eu queria que me amassem também, mas só uma podia andar por esses corredores com o mundo aos seus pés, e tinha que ser eu. Eu! — A loira solta, apontando o dedo indicador pra si mesma enquanto grita e afasta os pais os empurrando com os ombros, tendo a certeza que parecia louca agora. — Eu briguei com aquela vagabunda naquele dia, e se ela não tivesse se fingido de desentendida e como se o mundo não girasse ao redor dela, eu não ia ter que empurrar ela do telhado! Eu sabia que você ou Mrs. Moon nunca iam olhar pra mim, como olhavam pra ela, mas ainda queria fazer ela pagar por destruir a minha vez, queria que ela sentisse dor e fosse machucada, porque ela merecia. E quando soube que ela nunca mais ia acordar do coma ou voltar a se mexer, eu festejei porque ia ser menos uma pirralha egoísta e metida pra ter que lidar. — CJ apoia as duas mãos na beirada da mesa de Mrs. Donovan, sorrindo pra ela com todo o orgulho que tinha dentro de si depois de expor aquilo tudo. — Fiquei olhando o sangue dela se espalhar pela calçada e cuspi no corpo dela, lá do alto, antes de começar a chorar e chamar todo mundo. Gritar pra alguém ligar pra ambulância, dizer que eu estava arrasada e nós éramos melhores amigas quando a polícia nos interrogou, e concordar quando disseram que só podia ter sido um acidente. A Jaime estava voando alto demais, como Icarus, e ia acabar perdendo as asas e caindo, mesmo. Eu não me arrependo de nada.
A loira toma fôlego, abrindo mais um sorriso inocente e gentil, antes de olhar pros pais por cima do ombro, e depois se voltar a Alexandra.
— E mesmo assim você me substituiu na primeira oportunidade que você teve, pela Mia. Mesmo se eu tivesse batido a cabeça dela no banheiro e fingido ser um acidente, você ainda ia escolher outra pessoa acima de mim. Você nunca compra as minhas brigas, me obriga a ter todas elas sozinha desde que cheguei aqui. Você não se importa, e a culpa é toda sua.
Os seguranças da escola chegam no minuto seguinte, ela nem percebe quando Alexandra aciona o botão de pânico e os pais se afastam dela no processo daqueles homens a retirando dali. Foi a última vez que ela viu Mrs. Donovan e esteve dentro daquele prédio, e não se importava se tivesse sido naquelas circunstâncias e ela estivesse chorando e aterrorizada quando ela saiu.
Ela não se arrependia, e tinha plena consciência que faria tudo de novo se precisasse pra chegar ao ponto mais alto da perfeição.
1 note · View note
madneocity-universe · 2 years
Text
Tumblr media
A N T I F R A G I L E
Avisos: o cenário pode conter bullying, perseguição, bodyshamming, o uso da palavra "retardada", capacitismo, agressões verbais e psicológicas, racismo e xenofobia. E, claro, menções explícitas a momentos de tristeza, ansiedade, distorção de imagem e insuficiência sofridos pela vítima desses ocorridos por decorrência deles mesmo.
Assim que Hana desconecta os aparelhos auditivos, o mundo externo fica mudo e ela finalmente se sente tranquila o suficiente pra estar ali em meio às colegas e jovens dos outros estúdios de dança do país.
Está feliz pela garota que tinha vencido, mesmo que ela não fosse a mais gentil com ela, não acha que nutrir ódio ou mágoa vai ser legal, e já tinha estrada suficiente na carreira de bailarina acrobática pra saber que a vida tinha seus altos e baixos naquele meio, e tudo que ela podia fazer era tentar melhorar e viver um momento de cada vez.
Ela não tem a menor intenção de ir atrás de CJ por vontade própria e parabenizar ela, mas quando ela chega na rodinha de adolescentes de seu conservatório, com quem ela tava tendo uma conversa animada em libras, sua primeira reação é sorrir pra ela de maneira educada, mas pela leitura labial consegue entender que… Bem, CJ estava sendo CJ mais uma vez, e tentando rebaixar o mérito dela dizendo coisas horríveis, que ela só não consegue terminar de entender porque a mãe toma sua frente, protetora e agressiva como sempre, e antes que ela mesma possa defendê-la, uma garota de cabelo preto vem correndo atrás de CJ, e as coisas saem do controle logo depois.
A falta dos aparelhos auditivos, nem de longe, tinham atrapalhado o espetáculo que se seguiu depois daquilo.
A memória mais antiga que ela tem e consegue se lembrar com cada detalhe, é quando ela e a mãe se mudaram pros Estados Unidos, com a promessa que as coisas iam ser fáceis e elas tinham um futuro cheio de possibilidades pela frente.
Todos os dias, sem falta, a mãe a colocava em um banquinho no banheiro na frente do espelho, enquanto segurava seus ombros e apoiava a cabeça em cima da sua, a fazendo repetir um monte de frases que, segundo ela, iam tornar as coisas mais simples e que ela sempre ia ver um lado positivo se acreditasse que existia um.
— Você é forte, corajosa e inteligente.
— Eu sou forte, corajosa e inteligente.
— Seus olhos são lindos, seu cabelo é lindo, e seu sotaque é fofinho.
— Meus olhos são lindos, meu cabelo é lindo e meu sotaque é fofinho.
— Você tem orgulho de quem você é, de como você é, e de onde você veio.
— Eu tenho orgulho de quem eu sou, de como eu sou, e de onde eu venho.
— Hoje, você vai ser boazinha e gentil com as pessoas, não vai deixar ninguém te diminuir por causa dos seus aparelhos, e vai fazer de tudo pra ter o melhor dia de todos.
Ainda assim, tudo parecia muito mais fácil quando ela era criança, e aquele lugar era só uma terra estranha que elas iam explorar juntas e desbravar cada canto até encontrar ali um lar, não aquele pesadelo.
Tem certeza que ficou pelo menos dois minutos observando os pedaços de post it grudados na mochila e nos pertences enquanto segurava as flores que tinha ganhado na competição, e se em algum momento tinha se sentido feliz por ter conseguido o primeiro lugar naquela corrida frenética até as nacionais, o sentimento tinha se perdido quando os olhos focaram nas mensagens escritas de qualquer jeito e em letras grandes pra ela e qualquer pessoa conseguir ver de qualquer lugar.
Porca obesa. Retardada. Volte pro seu país!
Tinha acabado de fazer valer uma semana inteira de ensaios contínuos e entregado o resultado mais puro de uma dedicação sem igual, então por que sentia como se o prédio pudesse cair em cima dela e ia doer menos do que ler aquelas coisas? Queria ficar triste e se sentir magoada e brava, mas a qualquer momento, alguém da equipe ou a própria mãe ia entrar naquela sala e se deparar com a mesma cena, e ela não queria puxar ninguém pra espiral dos próprios problemas.
Aquele estava sendo um bom dia, ela podia ignorar isso e seguir de cabeça erguida, e era exatamente o que ela ia fazer.
— Ei, você já está pronta pra nós irmos? — Ji a alcança no corredor bem na hora que ela joga os papéis em uma lixeira, todos rasgados ou amassados, e mesmo assim ela parece perceber, no jeito que Hana se encolhe quando ela apoia uma mão em seu ombro, que algo está errado. — Tá tudo bem?
E ela sabia que o melhor era falar, que podia contar com Montgomery, que ela podia ajudar, mas ela não queria ser um problema. Ela acreditava que podia passar por aquilo sozinha.
— Estamos levando outro troféu pra casa, a senhora acha que eu poderia estar mais feliz? — Ela acreditava, mesmo, que só precisava colocar um sorriso no rosto e viver mais um dia, até aquilo a consumir por dentro.
— Damian, você acha que eu devia perder peso?
A pergunta vem de forma tão aleatória e rápida, que Donovan se desequilibra na barra que estava usando pra se alongar. Além de Nell, não era como se ele convivesse com muitas meninas, então era muito difícil saber o que estava passando pela cabeça da melhor amiga enquanto ela se olhava no espelho, porque tudo o que ele via era uma pessoa magra e cheia de músculos perfeitos, igual todas as meninas do curso dos dois, mas ele não sabia como dizer aquilo e nem como ela receberia sua opinião, então achou melhor ir na fonte.
— Você acha que você devia perder peso? — Ele começa, tomando alguns passos pra ficar na barra do lado dela, os olhos treinados agora na figura dos dois no reflexo do espelho. — Alguém disse que você devia?
Hana se vira pra ele com o cenho franzido, mentalmente se perguntando se ele sabia dos post it da outra semana, ou dos comentários que ela via e ouvia durante a troca de apresentações nos teatros que eles se apresentavam, mas algo na expressão dele dizia que aquilo era uma armadilha, e que ela estava prestes a cair. Ele não sabia, queria que ela confirmasse, então iria se meter, pegar o problema pra si, e defender ela como um amigo faria. Damian era muito esperto e reativo, então ela precisava contornar antes que ele percebesse.
— Eu… Não, claro que não. Foi só uma pergunta, aparência é sempre um tópico presente… Pra bailarinos, você sabe disso. — Ela mente, e sabe que ele não acredita, mas mesmo assim ele confirma com a cabeça, então ela decide mudar o assunto. — E como vão as coisas com o Harvey? Vocês se falaram no memorial da sua amiga?
Hana se sente meio egoísta por só estar abordando ele sobre aquilo agora, depois de Damian ter passado quase uma semana inteira sem aparecer no conservatório. Ela só podia imaginar como ele se sentia, depois de perder mais alguém importante no mesmo ano que a avó dele, e toda aquela situação confusa com o garoto por quem, ela sabia, ele definitivamente estava apaixonado e querendo mais do que passar um tempo, por isso começa a cutucar o braço dele, cobrando uma resposta quando ele parece rígido e nem um pouco disposto a falar, até começar, usando as libras também.
— Não vi ele durante o memorial, mas a irmã dele sim, e ela ficou bastante chocada quando eu disse que a gente não estava mais saindo junto… E, sinceramente, não acho que eu estava bem naquela época de qualquer maneira. Vai ver ele sentiu que eu não ia prestar como namorado com tudo aquilo acontecendo comigo. — Donovan desabafa com ela, que solta um suspiro antes de o envolver em um abraço de lado, o qual ele retribui quase naturalmente, quando os outros alunos começam a chegar aos poucos. — Eu devia tentar falar com ele de novo, agora que as coisas parecem mais no lugar.
— Eu sinto muito. Devia falar com ele agora que se sente melhor e conseguiu conversar com sua família, a terapia é mais importante, mas se for te fazer se sentir melhor… — Hana o conforta e assegura, abrindo um sorrisinho que acentua as covinhas em suas bochechas, antes de acrescentar. — Eu vou estar aqui pra apoiar você.
Era tão estranho como ela não conseguia apoiar a si mesma, mesmo quando tinha certeza que ela podia se bastar contra tudo e todos.
Pensando agora, ela nem consegue aceitar que não conseguiu fazer nada na hora que as meninas da Academia Moon a encurralaram na loja de roupas que a maior parte dos estúdios de dança tinha como referência, e ela estava sozinha e muito longe dos colegas procurando um vestido específico pro próximo fim de semana. O jeito como elas a cercaram até ela se sentir sufocada, sorriam pra ela, tocavam em seu cabelo e até o crachá que ela sempre usava na rua indicando que ela era deficiente auditiva caso algo acontecesse.
— Eu sabia que uma hora ou outra, nós íamos conseguir pegar você sozinha, porquinha surda. — A garota mais alta e loira, talvez a líder do grupinho, toma a frente das outras, analisando Hana de cima a baixo, fazendo ela se sentir tão desconfortável que pensou que ia começar a chorar. — Tem muito mais de onde veio aquela homenagem que nós fizemos pra você.
Quanto mais ela tentava sair de perto delas, mais era prensada e cercada, enquanto elas riam dela, puxavam seu cabelo e até beliscavam ela. Eram tantas, e durou por tanto tempo que parecia um pesadelo e não que ela tinha ficado lá por todos aqueles minutos até alguém começar a procurar por ela e elas se dispersarem como se não tivesse sido nada. Conseguia sentir a atenção de Damian em cima dela o caminho todo de volta pro prédio do conservatório, e sabia que era só questão de tempo até ele conseguir o que queria dela, então ela contornou mais uma vez antes mesmo dele ter a chance.
— Como sua amiga ficou em coma? Eu não tinha chegado na cidade na época que ela se machucou, e ninguém nunca me contou a história. — Estavam no telhado do prédio, a cabeça dele em seu colo enquanto os dois olhavam pra cidade ficando mais escura depois do fim das aulas. A mãe dele ia aparecer a qualquer momento pra buscar os dois, então era bom aproveitar aqueles momentos de calmaria depois de tantas horas ensaiando.
— Foi a coisa mais estranha de todas. Era começo de semestre, todo mundo só queria se divertir antes de começar tudo de novo, então fomos pro telhado. A gente já tinha descoberto a metástase da minha avó na época, então claro que eu e o Connor só queríamos beber e esquecer todos os problemas em casa… Todo mundo estava lá, mas ninguém viu quando aconteceu. Descartaram suicídio na mesma hora, ela só devia… Estar andando lá, e acabou se desequilibrando. Uma amiga achou ela e foi muito tenso, porque éramos jovens bêbados e uma garota sangrando na calçada depois de se tornar campeã nacional pela terceira vez. — Damian faz uma pausa e solta um suspiro, a mão de Hana alcança a sua e ele aperta os dedos dela com os seus, antes de continuar. — A Jamie era perfeita e nós amávamos ela, ela conseguiu chamar a atenção de todo mundo e fazia qualquer coisa. Minha avó ficou tão magoada quando soube, e ela já estava tão doente que não conseguiu visitar ela no hospital uma vez sequer. Fica pior quando a gente percebe que uma não conseguiu se despedir da outra, e não tem nada que eu ou qualquer outra pessoa pudesse fazer. Só queria que elas soubessem que nunca estiveram sozinhas.
Quando a mãe chega do trabalho e a vê sentada no sofá e não pensa duas vezes a não ser ir até ela, sem nem tirar o casaco ou os sapatos quando percebe que ela está chorando, Hana se arrepende de fazer o que está prestes a fazer, porque sabe que ela está cansada, e quer tudo, menos lidar com os problemas que ela ainda nem sabe que a filha tem, mas sente também que se não for agora, simplesmente não vai ter mais coragem.
— Umas meninas… Umas meninas estão me intimidando durante as competições e quando nos vemos pela cidade. — Hana começa, às mãos tremendo em cima do colo, sentindo dificuldade pra respirar. — No começo achei que era normal, porque sou mais jovem do que elas e seniors costumam ser assim em qualquer lugar, mas… Mãe, elas são tão malvadas. As vezes sinto que não é o meu lugar, e que não deveria estar, que estou tomando o lugar de alguém e que elas estão certas. Eu só queria… Eu só queria ser normal.
No mesmo instante, a mãe se abaixa diante dela, as mãos agarrando as suas trêmulas, o coração doendo no peito por ver a única criança dela, a pessoa que ela mais amava no mundo, daquele jeito.
— Querida, você é uma menina normal, você é…
— Surda, e um dia, os aparelhos não vão ser mais suficientes e nem mesmo eu sei se vou conseguir me adaptar sem eles, e dançar sem eles… E eu nem sou tão bonita ou alta ou boa quanto elas, Mrs. Montgomery só me mantém porque não tem outra solista e as pessoas sentem pena de mim, foi o que elas me disseram, e eu sei que é verdade. Eu não sou boa o suficiente, e estou quebrada. É a verdade.
O coração de Hana se quebra em milhares de pedaços depois de admitir aquilo pra si mesma em voz alta, e o da mãe também, depois de perceber que todos aqueles anos a criando pra ser gentil e boa consigo mesma, tinham sido jogados fora por um bando de meninas cruéis. E a pior parte é que não ia ser a primeira, e nem última vez.
— Hana Park, você é uma imigrante norte-coreana, sua existência e sobrevivência já devia ser um motivo de orgulho sem igual, porque conseguiu lutar por você mesma pra fora daquele inferno ao meu lado e nunca desistiu dos sonhos que nós tínhamos até chegar aqui. — A mãe começa, sentindo o rosto ficar molhado de lágrimas também, enquanto usava uma das mãos pra aproximar o rosto da filha do seu e garantir que ela tivesse toda a atenção sobre ela. — Você é uma sobrevivente, uma combatente, uma guerreira e a garota mais corajosa que eu conheço. Se lembra de como foi difícil deixar aquele lugar? Do perigo que nós corremos? Vai mesmo deixar meia dúzia de meninas te tratarem desse jeito, depois de tudo? Querida, são só meninas, você já enfrentou um país armado inteiro.
O tom da mãe era duro, quase sério demais, mas necessário, enquanto Hana concordava com a cabeça e sentia o fluxo de lágrimas nos olhos cessar a cada palavra dela.
— Você é forte, você é corajosa e inteligente e eu não mudaria nada sobre você. Você se salvou oito anos atrás naquela fronteira, você pode passar por isso. Você não está sozinha, só queria que você soubesse.
E ela sabia.
1 note · View note
madneocity-universe · 2 years
Text
Tumblr media
M A Y D A Y
Nunca na vida precisou abrir o coração pra alguém daquele jeito, se sentia tão exposto e desconcertado diante de Harvey que achou que ia começar a passar mal, mas sua mãe, pai e Connor II estavam do lado oposto do corredor, segurando sorrisinhos felizes em seus rostos enquanto erguiam os punhos no ar dando todo o suporte que ele precisava.
Era isso. Era agora.
— Sinto muito se foi algo que eu fiz, disse e dei a entender que possa ter te magoado, sabe, nunca foi minha intenção, porque gosto de você, muito mesmo, e nunca faria algo que pudesse te jogar pra longe de mim. — O mais jovem dizia, sentindo as palmas das mãos suarem ao observar a expressão surpresa de Smythe-Lee, a própria confissão o deixando chocado também, mas tratou logo de afastar os pensamentos e continuar. — Eu passei por umas coisas que me deixaram muito chateado e desacreditado de tudo e todo mundo, mas também aprendi que não posso passar a vida irritado e revoltado com tudo o que acontece. Eu preciso me encontrar e descobrir o que eu quero, e agora, sei que quero te levar pra sair como meu namorado, e falar com você como meu namorado, e te beijar e agarrar sua mão como meu namorado e não só um menino aleatório que eu passo um tempo de vez em quando. Quero ficar com você.
— Damian, eu…
Ele nunca conseguiu ouvir o final daquela frase, e num futuro não muito distante, ia preferir nunca saber mesmo da resposta dele.
Estava bravo do lado de Connor II porque ele tinha se dado ao trabalho de dirigir até o Conservatório, interromper uma aula sua sem mais e nem menos, o tirar de lá no meio do dia com a desculpa de que era uma emergência e que era seu irmão mais velho. E mesmo assim não queria dizer do que se tratava o assunto, e porque ele estava numa sala com todos os outros sócios e parceiros da Academia da família e nem um daqueles velhos tinha a intenção de atualizar ele sobre nada, também.
— Você é um escroto, só porque não liga mais pra dança, não quer dizer que eu não me importo em perder minhas rotinas, sabia? — O mais jovem declara ao lado do irmão mais velho, sabendo que soava mais birrento do que qualquer outra coisa, não perdendo a maneira como Connor se segura pra não revirar os olhos. — Por que eu tô aqui? Vão trocar o fornecedor de sapatilhas e precisam que eu assine o contrato também?
— Você é insuportável… — Connor II começa, mas não tem a chance de continuar com a prima e a mãe entrando na sala. Nell tomando o lugar ao lado dele, e Alexandra o seu de presidente daquele pequeno conselho, com a expressão vazia que ela sempre usava pra momentos como aquele.
— Você é o único que me arrastou pra cá sem dizer nada. — Damian o provoca mais uma vez, recebendo um suspiro em troca, ao que Nell da uma cotovelada em Connor e nem isso parece o abalar.
— Não contou pra ele por que estamos aqui? — Ela o questiona, unindo as sobrancelhas e parecendo prestes a matar ele. — Você teve uma hora inteira pra preparar ele.
— Do que vocês tão falando?
— Tá vendo? É por isso que você é insuportável. Vocês dois são. — Então Connor finalmente explode, batendo uma mão na mesa e chamando a atenção de todos os presentes pro trio.
O olhar de Alexandra é tão frio e duro que os três se encolhem de uma só vez, se desculpando ao mesmo tempo e não trocando mais nem uma palavra enquanto ela toma frente da reunião.
— Na posição de herdeiros, vocês não tinham obrigação de fazer parte das reuniões do conselho, mas agora são sócios majoritários com a mesma porcentagem de relevância e voz ativa que eu, como último pedido da sua avó, assim como o Christian e o Yuta dividem as obrigações do hospital com seu avô, agora. Então, por favor, se comportem como tais e respeitem esse conselho, porque não são mais crianças e tem um dever agora, e uma posição muito importante nas mãos. — Ela odiava, detestava, tratar eles como tratava as outras pessoas ali, mas fazia parte da imagem profissional que ela tinha que manter pra fazer tudo funcionar, e quanto mais cedo eles soubessem que as coisas iam ser assim na falta da avó, e em algum dia, na falta dela, ia ser melhor. Achava que ia ser mais fácil se eles aprendessem a cuidar do que era deles daquele jeito. — Kyoya está ocupado com a própria agenda, mas tem total noção do que estamos fazendo aqui hoje e do que vai ser discutido, assim como vocês vão ter… Agora, quando abrirem os documentos de vocês.
Damian abre o Tablet em cima da mesa e a primeira coisa com a qual se depara, são informações da receita da academia, que parecia tão alta e estável como sempre, e apesar de ele não fazer ideia do que todos aqueles números altos e quadros positivos representavam, sabia que os negócios iam bem mesmo com as perdas que tinham sofrido no começo do ano. A avó, e então uma das bailarinas que não se encontrava mais ativa, mas trazia uma visibilidade e engajamento absurdo com a quantidade de vezes que ela ganhou algo.
Conseguia ouvir a conversa fiada dos adultos na sala, e uma discussão sussurrada entre Nell e Connor, a qual ela parecia estar vencendo no cansaço, mas ele não estava prestando atenção enquanto passava as páginas, e chegar num tópico que deixou ele imediatamente confuso.
— O que… Decisão dependente de votação quer dizer? — Ele se vira pro irmão, e depois a mãe, não achando mais nada depois daquela frase de resumo da reunião. — O que vamos decidir hoje? Por que precisamos votar?
— É sobre a Jamie. Nós precisamos falar sobre a Jamie. — Connor então se volta pra ele, pela primeira vez desde que o tinha arrastado pra lá, achando mais fácil dizer aquilo com mais pessoas por perto, então ele não tinha nem uma chance de se sentir mal, assim como Nell, e a mãe. — Ela é responsabilidade da Academia, é algo que precisamos tratar.
— A Jamie tá no hospital lutando pela vida dela, não temos nada pra tratar sem ela aqui. — Damian comenta, puto, mas mantendo o tom baixo e educado. — As despesas médicas dela são responsabilidade do nosso próprio hospital, então por que…
— Ela não tá bem, Damian. — Nell o interrompe, se inclinando em cima da mesa pra olhar pra ele. — Estamos aqui pra cuidar do que vem depois.
Na época do acidente que deixou Jamie em coma, a avó ainda estava ali e consciente suficiente pra primeira votação que decidiria se eles iam arcar com os cuidados dela ou não, e ainda que o dever agora tinha caído sobre ele, não imaginou que ia passar por aquilo. Duvidava inclusive que a avó aceitaria uma coisa daquelas.
Agora estava revoltado e puto, e nem um pouco disposto a ceder.
— Não podemos abandonar ela, sabe quantas vezes ela trouxe um troféu pra cá?
— Damian…
— Só porque ela não gera mais lucro ou atenção pra academia, não podemos ir lá e simplesmente decidir se ela merece viver ou não.
— Damian, por favor.
— Foi um acidente, ela não teve culpa. Somos as pessoas em quem ela confia, somos a única família que ela tem, e vocês querem mesmo trair ela assim?
— Damian, já chega!
Mesmo com a explosão da mãe, estava se sentindo inspirado em continuar jogando aquilo tudo ali e expor o quanto estava indignado, mas o aperto em seu braço vindo de Connor e a maneira como Nell parecia estressada e prestes a dar um grito, fez ele recuar, mais uma vez.
— O quadro da senhorita New é irreversível e não existe a menor indicação de que ela vai responder ao tratamento, os órgãos dela não conseguem mais funcionar sozinhos e os danos só pioraram com o tempo, e não tem mais nada que nós possamos fazer por ela. Ela vai morrer, Damian, e a culpa não é de ninguém. — O tom da mãe era mais calmo agora, e ela parecia bastante tranquila, ou se fazendo parecer pra não sobrecarregar mais os três adolescentes que ela precisava acolher e consolar agora. — A votação é só pra saber se todos estão de acordo com a possibilidade de doação de órgãos, agora que temos uma resposta definitiva do hospital e a marca Moon é responsável legal pelos assuntos sociais e jurídicos e da senhorita New.
Os parceiros e demais sócios mais velhos parecem já ter uma decisão entre sim e só trocam acenos de cabeça, quando Nell encolhe os ombros e toma sua própria frente da reunião.
— Vovô… Dr. Moon disse que tem essa garota, e que ela tem esperado por um transplante de rosto faz um tempo. Ela sofreu um acidente faz uns anos, e a Jamie parece a candidata perfeita pra ela voltar a ter uma vida normal agora. Na verdade, eu conheci ela hoje e ela parece uma pessoa bem legal. — Donovan abre um sorriso, a tensão deixando os ombros ao se lembrar do encontro aleatório e de negócios que precisou ter antes de parar ali, com uniforme da escola e tudo, as mãos cruzadas em cima da mesa. — Mas sem a permissão, a cirurgia não pode ser feita. A decisão com maior número de votos ganha, e independente do resultado, vai ser imediato.
Então, independente do resultado, ela ia os deixar naquele mesmo dia e tudo precisava ser resolvido, ali e agora, como um negócio. Como todos os negócios daquele lugar.
Damian sabia que não era aquilo que incomodava ele, e que ele não podia e não queria impedir uma garota que ele nem conhecia de ser salva, por isso levantou a mão quando a mãe perguntou se estavam de acordo, e assinou todos os documentos autorizando o procedimento e qual a melhor forma de proporcionar a despedida mais respeitosa pra Jamie New quando ela enfim descansasse. Era tudo muito maior do que ele, e parecia continuar se acumulando e crescendo dentro de si sem freio.
Damian odiava admitir, mas sua relação com Connor e a mãe era a pior agora, e por mais que quisesse culpar eles por não aceitarem que ele frequentava o Conservatório, sabia que era ele mesmo que estava afastando os dois desde que a avó tinha morrido.
Mesmo morando debaixo do mesmo teto e convivendo todos os dias, passava a maior parte do tempo evitando os dois com todas as forças, e quando se sentia sufocado, preferia provocar os dois até o último nível, porque só uma briga feia o faria sentir toda a raiva que precisava pra empurrar todos aqueles sentimentos de volta pra dentro dele, e achar que não precisava da ajuda dos dois. Mesmo que ele quisesse, mesmo que ele soubesse que precisava, não ia deixar eles chegarem perto dele enquanto não tivesse as coisas em ordem.
Até não ter mais tempo, e ele explodir.
O quarto de Connor ficava bem ao lado do seu, e se tinha alguém capaz de ouvir primeiro sua crise de choro desesperada, uma semana depois da reunião na academia, era ele.
Foi tudo tão rápido, quando Connor o encontrou encolhido na própria cama, tremendo e grunhindo enquanto chorava, e correu pro quarto só pra alcançar o celular e conseguir falar com o pai, antes de parar no meio do corredor e pedir ajuda pra mãe, nervoso e começando a ficar ansioso também, quando ela nem mesmo colocou algo por cima do pijama e só saiu apressada e em linha reta pro quarto do filho caçula.
— Damian, é a mamãe. Estou aqui, querido. Você não está sozinho, por favor, olhe pra mim. — Alexandra tentava manter o tom calmo e parecer tranquila, segurando os ombros dele com as suas e olhando pros olhos dele, uma das mãos então indo parar em seu peito, sentindo seu coração acelerado. — Respire devagar e olhe pra mim, seu irmão está falando com seu pai agora, todos nós estamos aqui pra ajudar você. Seu quarto é seu espaço seguro, e nada vai te acontecer aqui. Só precisa respirar, e olhar pra mim.
Ele tentava acompanhar a expiração da mãe, mas só conseguiu se controlar quando Connor tomou o lugar ao lado dela e sincronizar a respiração com os dois, as mãos tocando as pernas de ambos ao mesmo tempo, deixando eles ligados.
Então a imagem do pesadelo que tinha tido volta, e ele só sente vontade de chorar por horas no ombro da mãe quando se lembra do cenário escuro e desesperador onde via a avó se perdendo no nada, e ele acima de todos não podia ajudar ela. Como areia escapando entre seus dedos, assim como Jamie naquele dia, e a briga com Harvey no outro. Cada pessoa com quem ele se importava e parecia nutrir suas partes boas, o deixando e deixando marcas também, com a mãe e Connor ali e o pai a só um telefonema de distância, a sensação de que podia perder eles também a qualquer momento o deixava enjoado e assustado.
— A vovó não devia ter ido embora, ela merecia mais tempo, ela merecia viver mais, ela merecia estar aqui. — Ele começa a soluçar de novo, vendo a mãe e o irmão suspirarem, só um pouco aliviados, porque a menção repentina depois de quase um ano de silêncio só deixava os dois preocupados. — Ela apodreceu e sentiu dor e se foi e a gente nunca pôde fazer nada além de assistir e esperar que as coisas melhorassem. Ela não merecia morrer daquele jeito, ela não queria nos deixar. Sinto tanta falta dela que dói, e tenho medo todos os dias de perder outro de nós como se não tivesse sido suficiente.
Quando Damian acha que vai cair, da maneira mais figurada, dentro dele e da confusão interna mais uma vez, se volta aos dois, em tom de súplica.
— Por favor, não me deixem. Por favor, nunca, nunca me deixem. Não posso suportar perder vocês também, eu amo vocês. São tudo o que eu tenho.
Os três se encolhem pra dormir naquela cama, juntos e ligados e consolando um ao outro naquela noite, como a família quase completa mas igualmente unida que eles sempre tinham sido, e agora, mais do que nunca, unidos com o mais forte dos laços.
— É tão bom ter você de volta. — Alexandra diz ao passar os braços em volta de Damian na manhã seguinte, o embalando como queria desde o ocorrido que os afastou. — Meu filho, minha criança preciosa. Você só precisava de tempo, só precisava sentir o seu luto.
Damian acha que o lugar mais seguro do mundo, é perto da mãe, por isso se deixa ser abraçado por ela, enquanto encosta a cabeça em cima da sua e sente todo o peso finalmente o deixar.
— Sinto muito por todas as coisas que eu disse, sinto muito por tudo que eu fiz. Eu fui um otário e você só queria me proteger. — O tom gentil é tão estranho pra ele, depois de meses oferecendo apenas seu lado amargo e irritado pra todo mundo, que ele quase quer chorar de novo, arrependido por ter machucado os outros. — Eu sinto tanto, mãe.
— Eu sei que sim, porque você é um amor, e tem compaixão em você e é um menino bom. Você é uma pessoa boa, Damian, e passou por tudo isso, e está tudo bem. — A mãe segura o rosto dele, apertando suas bochechas juntas como fazia quando ele era criança, sorrindo com todo o amor e carinho que cabia nela.
— Vou sair do conservatório.
— Não, você não vai, porque tem um compromisso com aquele lugar e você tem honra e respeito em você, também.
Ele jura, fica chocado nos primeiros cinco segundos, mas depois entende, pela expressão tranquila da mãe, que ela realmente queria dizer aquilo. Porque ela mesma tinha o criado assim.
— Então vou trazer aquele troféu nacional pra casa. — Ele murmura, abrindo um sorriso mínimo, ao qual ela copia enquanto confirma com a cabeça.
— É claro que vai, você é meu filho, e não tem nada que você não possa fazer. Você merece o mundo, Damian.
1 note · View note
madneocity-universe · 2 years
Text
Tumblr media
B E A U T I F U L M O N S T E R
Avisos: O cenário pode conter episódios de ansiedade e estresse, bullying, perseguição, intimidação, ameaça e episódios de Transtorno de Despersonalização não diagnosticado. A personagem também atenta contra o próprio bem estar físico.
Ela jura que nunca na vida sentiu tanto ódio quanto naquele momento, e por mais que seu cérebro avisasse que aquilo ia ser uma péssima ideia e que ela se arrepender de tudo em algum momento, tudo o que ela via era vermelho, e tudo o que ela ouvia era CJ Han pedindo por aquele dia desde a primeira vez que elas tinham se conhecido.
A sapatilha de ponta dura em sua mão era sua arma, e sabia que tinha a força de um exército dentro dela, acumulada e esperando o dia perfeito pra explodir e causar todos os danos reversos que toda aquela situação exigia.
Ela não queria e não iria matar CJ Han, só machucaria ela com muita força.
Ela não faz a menor ideia de como chegou na sala de ensaio pra primeira aula do dia, mas quando olha ao redor, todos estão seguindo a rotina, e ela sente o próprio corpo repetir os mesmos movimentos, como se não precisasse dos comandos de sua consciência e consentimento pra realizar nada. E seja lá quem for a garota refletida no espelho, rodopiando e ficando na ponta dos pés e movendo os braços em arcos perfeitos e depois repetindo tudo de novo, Mia não vê nem uma verdade nela, mesmo que elas sejam a mesma pessoa.
Aquilo acontece mais duas vezes. No minuto que sai do palco de competição depois de terminar uma coreografia, e ela só parece se dar conta quando as pessoas ainda estão aplaudindo na plateia e sente os pais a abraçando por trás das cortinas, dizendo que ela foi linda, e que aquela música tinha combinado com a aura dela, e que o cor-de-rosa da roupa tinha acentuado todo o visual e ela parecia brilhante. Precisou de um tempo pra entender quando tinha concordado com aquela música nos ensaios, e olhar pras próprias roupas pra perceber que era mesmo um vestido rosa de glitter, e mesmo que ela tentasse muito, não conseguia lembrar quando aquela preparação aconteceu. E nem o que ela tinha apresentado pro público, sorrindo como se nada tivesse acontecido, agradecendo e parecendo animada como esperavam de alguém que, aparentemente, levou o primeiro lugar. E não fazia ideia como.
A terceira vez, foi no refeitório da academia. Ficou um bom tempo olhando todas as opções de barra de granola da máquina automática, e em segundo plano, por cima de toda a conversa dos alunos e instrutores, sabia que alguém estava tentando chamar a atenção dela, mas não conseguia fazer o menor esforço pra responder, se virar ou mostrar que tinha entendido, até alguém se abaixar pra pegar a embalagem que tinha caído depois dela pagar.
— Odeio quando isso aqui fica caótico, você não concorda? — CJ Han aparece em seu campo de visão, erguendo na direção a barra de cereal dela enquanto lhe oferece um sorriso sutil. Como se não tivesse uma crise de ódio toda vez, nos últimos quatro meses, que Mia era escolhida na frente dela. — Faz a gente ficar perdido e confuso.
Porra, então era ela? O que a porra da CJ Han queria com ela? Elas nunca se falavam, elas não eram amigas, ela fazia questão de expressar o quanto detestava Smythe-Lee em sua frente e nas costas também, e tudo o que trazia era ódio e uma violência sem controle.
Mas ainda assim, Mia sorri pra ela, de uma maneira gentil, agarrando o lanche de suas mãos quando diz:
— Eu não tava afim de te responder. — E ainda completa com a cara mais cínica que consegue manter, quando a loira arregala os olhos. — E não é como se você estivesse surpresa também.
Não era mentira. Seu subconsciente é fiel, e por mais que ela estivesse viajando ali uns minutos atrás, sabe que jamais, em um milhão de anos, se daria o trabalho de socializar com pessoas como CJ Han.
— Ah, pobrezinha. Acha mesmo que pode fazer e dizer o que quer nesse lugar, como se ele fosse seu. — A outra começa, com um sorriso divertido, observando Mia dos pés à cabeça. Sem julgamentos, nem desdém. Só um olhar muito persistente e indecifrável em cima dela. — Querida, estou aqui há quatro anos, você chegou há quatro meses, e seja lá o que for que você pensa que está fazendo, eu acho melhor parar. Você pode ter o prestígio e os solos e achar que eles amam você, mas eu estava aqui antes, e você não tem nem um lugar aqui.
O tom de Han era doce, mas tão perigoso ao mesmo tempo, que Mia se sente encolher, fisicamente e mentalmente, quando a loira chega mais perto dela, o suficiente para falar perto de seu ouvido.
— Cuidado pra não voar muito perto do sol, ou vai acabar caindo também.
No final da semana, ela finalmente deixa tudo a consumir, e chora ruidosamente dentro do próprio carro quando a aula na Constance termina e ela sabe que no dia seguinte, vai ter que entrar em um ônibus com todos os colegas a caminho de mais uma competição que ela não sabe se quer mais participar. Os ombros ficam tremendo e as mãos também e a visão fica embaçada por uma hora inteira, o telefone se enche de mensagens dos pais preocupados com ela, seu carro quebrou? Vai precisar ficar pra estudar? Precisa que a gente te busque? E até Harvey se lembra dela, mas só pra saber se ela estava animada pro dia seguinte, e é aí que ela acha que vai derreter e explodir, batendo as duas mãos contra o volante com tanta força que era um milagre não ter quebrado os pulsos ou nem um dos dedos. Ela não sabe de onde aquilo veio, e nem qual era o propósito, mas não se sente melhor quando termina.
— É como se tivesse deixado de fazer sentido depois que a gente veio pra cá. — A morena estava desabafando olhando pro teto, estirada na cama do próprio quarto. Era domingo, então não tinha que ir pra escola e nem pra academia e podia ter um dia livre com a família, mas o caos dos Lee todos juntos na sala, a fez fugir logo atrás do primo, Gun, que tinha achado um escape de auto regulagem organizando as sapatilhas dela. — Como se eu tivesse passado uma vida inteira sonhando em vir pra Los Angeles, ficar mais perto de todo mundo, e estudar dança naquele lugar, e agora que estou aqui, tenho vontade de me enfiar na frente de um carro quando lembro que preciso continuar indo lá, dia após dia, fazendo algo que eu costumava amar, mas que agora eu odeio com todas as minhas forças. Parece que eu sou uma farsa sem o Harvey do meu lado.
Guns parece muito concentrado sobrando os laços soltos, pra ficarem todos milimetricamente perfeitos, e qualquer um poderia pensar que ele não estava fazendo parte daquela conversa e nem tinha sentido a presença de Mia ali, mas era só o jeito dele, e ela sabia que ele tinha ouvido cada palavra sua e só estava contemplando uma resposta na cabeça com todas aquelas informações.
— O Harvey não tem nada a ver com você se sentir desgastada do ballet. — O tom do mais jovem é monótono, mas muito decidido também, quando dá alguns passos pra longe da prateleira e contempla o trabalho de organização. — Você só colocou na sua cabeça que precisa se esforçar o dobro porque é sua escola dos sonhos, e você não sabe dizer não pra si mesma.
— Isso não é verdade, eu sei dizer não. Não faço nada além dos meus limites e conheço todos eles. — Ela se defende sem nem deixar ele terminar de falar, ficando tão irritada que sente vontade de jogar alguma coisa nele.
— Tentar quebrar sua própria mão numa crise, parece um jeito muito forte de mostrar o quanto você está tentando fugir dessa situação, mas não sabe como.
Mia sente a respiração ficar presa na garganta, porque ela era a única pessoa dentro daquele carro quando ela tentou aquilo.
— Como você sabe que eu fiz isso?
— Foi você que me contou, assim que eu cheguei aqui.
— Não me lembro de ter dito isso.
— Você tá estressada demais pra lembrar.
E era verdade. Sua mente parecia trabalhar vinte e quatro horas por dia em prol daquela carreira de bailarina que vinha construindo desde criança. Era tudo sobre fitas, trajes, rotinas, ensaios, comer o suficiente pra não ficar doente e nem ganhar peso demais, conciliar aquilo com a escola, ser uma boa colega e aluna, chegar em casa e atualizar os pais de tudo o que ela fazia porque eles eram as pessoas mais interessadas no sucesso dela e como ela se sentia.
Compartilhar o amor com o irmão, e ficar horas se convencendo que aquele ainda era seu amor também, até se esquecer de quem ela era de verdade e o que estava tomando lugar desde então.
— Era tão fácil antes, que não aceito que não seja agora. — Ela não sabe que está chorando até Gun oferecer sua caixa de lenços pra ela, ao se sentar do lado dela na cama, mas só o suficiente pra ela saber que ele estava lá. — O que eu vou fazer com todos esses anos dedicando a… A ser quem eu sou agora? Não tenho nem planos de ir pra faculdade ou trabalhar com qualquer outra coisa que não seja em cima de um palco. Como se eu fosse uma pessoa totalmente diferente, e não me reconhecesse nem quando olho no espelho, sempre assistindo a minha vida do lado de fora. Eu fiz isso a minha vida inteira e não conheço mais nada além disso, nem acredito que seja boa em qualquer outra coisa e… Gun, o Harvey…
— A gente não tá falando do Harvey, vocês são indivíduos e você não é obrigada a seguir os passos dele pra sempre só porque são irmãos e vocês passam a maior parte do tempo, fazendo tudo juntos. A sua vida é só sua, e é melhor descobrir isso agora, aos dezessete. — O mais jovem joga de uma vez só, ignorando totalmente o fato de que aquilo só fez ela chorar com ainda mais força. — Você não vai deixar de ser você se parar de dançar. Vale mesmo a pena se machucar desse jeito, por um sonho que você não tem mais e não consegue sustentar sozinha? O que tá te impedindo de se livrar desse peso e fazer algo pra se salvar, Mia?
Na segunda a tarde, estava pronta pra entrar na sala de Mrs. Donovan e dizer tudo o que ela sentia. Como seu corpo todo não suportava mais o esforço físico que ela fazia, como sua mente estava exausta e ela não tinha mais nem um ânimo de assistir qualquer uma das aulas, como todo aquele ambiente de responsabilidade e competitividade excessiva não funcionava pra ela já fazia um tempo, e que não tinha mais o menor interesse de fechar aquele semestre ou ir pras competições representando a escola. Mas quando empurrou a porta, CJ já estava lá, sentada em uma das cadeiras e parecendo prestes a entrar em combustão, enquanto a mulher mais velha na frente das duas tinha o maior de todos os sorrisos. Muito alegre em anunciar.
— Decidimos que vocês duas vão pras nacionais e vão fazer cada uma um solo, mas com o mesmo tudo. Não ia ser justo escolher só uma, quando as duas se alcançaram, e nem justo não dar o mérito pra ambas, então é um acordo. — Mrs. Donovan parece tão feliz, que Mia jura que aquilo parecia contagioso.
Ia pra Nova York, ia dançar pra dezenas de centenas de pessoas e se apresentar pra todos os olheiros mais importantes do mercado, e ia ter tanta sorte se conseguisse a atenção de só um deles em cima dela. Talvez um nacional daquele porte, fosse o que ela precisava pra se encontrar, pra não jogar todos aqueles anos de devoção fora e ser fadada a ser uma pessoa perdida que nunca sonhou ou almejou outra coisa na vida.
— Tudo bem, eu posso fazer isso.
Se sobrecarregar com mais tarefas e ficar mais ansiosa, definitivamente, era só um bônus ruim. No fundo, faria qualquer coisa pra não se sentir daquele jeito, como se tivesse tomado uma decisão errada, e que aquele milagre era tão ruim, que não tinha nem um nome. Não importa quantas vezes ela se imaginasse em cima de um palco com a casa cheia, com o traje mais bonito da face da terra e com a rotina mais incrível que alguém pudesse pensar pra ela e só ela, o peso sob seus ombros ainda estava lá, quase insuportável de carregar, e nem se enfiar naquela ducha gelada por longos minutos no banheiro vazio fazia ela se esquecer dele.
Era como se estivesse a observando, esperando pra cair sobre ela e a matar sufocada no próprio medo de ser um fracasso em qualquer outro caminho que seguisse, mas quando se vira pra outra parede, é CJ que estava no outro boxe, a olhando com tanto ódio que ela sente cada pelo de seu corpo se arrepiar na mesma hora.
As duas estavam sozinhas ali, e em momento algum a atenção da loira se desviou dela. Todos os instintos de Mia gritavam pra ela sair dali o mais rápido que conseguisse, como se soubessem de um perigo que ela não fazia a menor ideia, até CJ abrir um sorrisinho pra ela, e voltar a lavar o próprio cabelo cantarolando uma música. Ela saiu tentando não parecer desesperada pra se distanciar dela, e aquela foi a última vez que tomou banho na escola antes de ir pra casa, ou ficar em qualquer lugar sozinha por muito tempo.
Iam ser os dois meses mais longos de sua vida.
0 notes