#textober

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Poison

I would feel its flavor on my lips and enjoy every second of it. I'd let it consume my body as if it was the cure for this sweet disease that I had created for myself. I'd let it run through my veins as if my life depended on it. And maybe it did.

Your loving lies would always be my favorite poison. I'd drink them bottom up, no questions, no fight. What a delightful way to say goodbye.

#words #textober #spilled ink #thoughts #feelings #poetry #poison

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Dia 7: Um Conto sem Diálogos

Receita de Bolo Para Samhain

Os amigos da Isis Morgana, todos eles com nomes tirados de Brumas de Avalon, dizem “sôu-en”, mas eu, que não sei de onde eles tiraram isso, digo “sá-má-in” e levo uns olhares feios que me fazem rir. Em outro dia, isso seria um bolo de canela queimado normal, hoje é um bolo de Samhain e desenharemos símbolos na massa, Eu e Isis Morgana. O gosto estará certamente tenebroso, mas aquele grupo de amigos dela não dirá que está menos que “mágico”.

Ingredientes:

Farinha de Trigo Muito ovos Canela Farinha de alguma noz, de castanha, ou pedaços.

Nada tem medida, por que nunca aprendemos a usar medidas para cozinhar nesta casa.

Tento colocar primeiro os ovos, bater em ponto de neve, depois os molhados, menos o leite, depois os secos. Farinha de trigo por último. E botar o leite para ficar com cara de bolo. Se esquecer da ordem, também sai bolo. Talvez só não fique tão fofinho e se a farinha for antes, ele com certeza, vai solar. É pão-de-ló. Pão-de-ló não devia solar, eu acho. O meu sola, então, farinha no final.

O recheio a gente faz geleia ou compra doce de leite pronto. Não vale a pena cozinhar leite condensado se nenhuma das duas sabe cozinhar com certeza. E geleia é só colocar muito açúcar e deixar a fruta cozinhar. Até eu acerto.

Por ser Samhain, escolhemos frutas fáceis de fazer geleia e vermelhas, pra ficar bem bonito, ou com uma cara sanguinolenta, se preferir assim. Igual aquelas árvores que são vermelhas por dentro e ficam esquisitas quando racham.

Eu sigo as instruções da Isis Morgana de que só pode misturar para um lado, sentido horário. Mais que uma questão mágica, misturar o bolo em dois sentidos faz ele solar. Cozinhe pensando em fazer pessoas felizes. É importante. Pense em dividir o que fez com as pessoas que tu ama e os amigos da Isis Morgana.

A parte mágica mesmo é Isis Morgana quem faz. Desenhos e círculos concêntricos que não tem fim, ela quem faz. Um ano ela queria me obrigar a comprar mirtilo, por que era chique e mágico e eu quase bati nela que esse treco nem tem direito e onde tem é 30 reais meio kilo. Fiquei muito chocada com o preço e claramente ela comprou, por que era para a Deusa e Isis Morgana sismou que precisava de Mirtilo.

Como só tinha meio kilo, misturamos com morango pra render um pouco. Não ficou nada azul, nem roxo direito ficou e fizemos o que devíamos ter feito desde o início. Pena foi ter que gastar passagem pra ir de novo pro centro comprar corante comestível azul.

Então, não esqueçam, farinha por último e corante comestível é essencial.

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Dia 5: Instruções de Como Usar Algo do Cotidiano

Uma fita vhs é uma fita preta, da largura de um palmo e dentro tem uma fita menor onde está o filme de verdade. Você coloca a fita vhs no aparelho de vhs, cabos todos conectados do vhs pra tv, todos ligados na tomada, e voilá, o filme passa. Não temos muitas fitas. Temos três, na verdade: Labirinto, que eu herdei da minha irmã, um filme de bruxas e um daqueles clássicos do cinema que você compra em banca de jornal com uma revistinha. Eu sempre durmo no meio, mas meu pai chora no final. Estou procurando a edição do Drácula pra Isis Morgana para comprar. Nem de aniversário, nem nada, por que ela gosta mesmo. Ela assiste tudo que é baseado em livro. Às vezes aparece algo assim na locadora, com um “baseado na obra de…” e eu alugo pra gente assistir, junto com a comédia romantica da semana. Eu posso citar Shakespeare por causa dela, a versão do filme. Igual a principal de Patricinhas de Beverly Hills. Eu e meu pai vamos na locadora sábado no fusca. Sábado cedo ou os lançamentos acabam. Ele dificilmente olha pra essa prateleira, meu pai, mesmo que a gente vá entregar tudo segunda-feira. Os filmes de terror parecem bobos. Escolho “A Múmia” entre os lançamentos. A capa me chamou atenção e acho que Isis Morgana deve gostar. Múmias são legais. Continuo olhando sinopses pra não voltar pro balcão e ficar encarando as balas em exposição ou dormir apoiada no meu braço. Duas opções possíveis. Por que esses olhos de cachorro que caiu da mudança, pai? Não posso rir. O filme que ele escolheu está em cima do balcão. Já está esperando por mim. Sem tempo pra ter dúvidas, vai “A Múmia” mesmo. Ele escolheu meu primeiro amor. Não é esse o nome daquele filme que o garotinho que morre picado por abelhas? Ele chora quando o garotinho morre. Minha mãe gostava desse filme. Ou ela fazia igual nós fazemos agora e gostamos desse filme pro meu pai ter motivo para alugar a fita dele em 20 das 52 semanas do ano. —— Escolhi esse aqui. —— De terror? Não vai te dar medo? —— Tá escrito aventura atrás. Parece divertido. A expressão dele diz “tem certeza?”. —— A múmia é de mentirinha. Ele suspira. Coloca as duas fitas sobre o balcão e põe a mão direita sobre as minhas. Só você pra achar que vou ficar com medo de filme de múmia, pai. Não quero mostrar riso pra ele não ficar chateado. Isso é muito bonitinho. —— A ficha da Isis Morgana? —— pergunta a atendente. Respondo que sim. Estamos nós dois na ficha da Isis Morgana. Não lembro por que foi ela quem fez. Eu teria feito a ficha, mas precisa ser maior de idade. Sempre fico com inveja de como ela digita rápido. Eu sempre cato milho no computador. —— Os dois filmes entregam segunda feira. Rebobinados, pra não ter taxa. Nos despedimos. Tentar convencer meu pai a comprar frango assado pro almoço. Vai durar até segunda e eu levo de marmita. Bife da Isis Morgana vira uma borracha. Sento no carro e meu pai pede pra eu colocar alguma fita pra tocar, qualquer fita. Sábados são bons. É… Eu gosto de sábados.

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Dia 02: Uma Página de Diário na Voz do Personagem de Ontem

Está escrito: Nísia não é do tipo que escreve em diários. Nem ter um ela teria, mas ela ganhou um caderno legal há uns dois anos. As folhas são boas e ela usa quando quer fazer um desenho legal, quando está inspirada.

De resto, ela rabisca no caderno, carteira, parede, ônibus e superfícies riscáveis.

[acessibilidade] Estão desenhadas também duas cabeças de leão e uma pantera cor de rosa com a mão rabiscada. Os desenhos são feitos a caneta e não seguem referência.

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Início do Subterrâneo

Este outubro bastante gente animou para extender o NaNoWriMo, começando já em outubro. Alguns preferiram flashfiction, ou as famosas faíscas, tem a preparação para o NaNoWriMo, tem gente estudando escrita, tipo eu.

Como eu penso em universos, não adianta prompts aleatórios, por que, no final, eu colocarei todos os prompts no mesmo balaio e criarei o megazord do fantasma robô sulafricano em Marte mandado pela própria AI do Elon Musk e comandado por fadas.

Melhor o que eu pretendo mesmo: quero estudar e colocar Subterrâneo no papel, de onde eu agarrei (o arco pro final não sai e eu quero mudar minha principal quase toda, não sei se faço isso de uma vez, aliás).

Os prompts usados serão esses aqui, da @Bia_Sa do twitter.

#textober #writing #escrita criativa #escrita #subterraneo50k

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Dia 12: O que Um Alienígena Pensaria ao Vir para Terra

Eu não estava prestando atenção. Eu sou praticamente surda e estava realmente interessada em terminar meu desenho de flores. Eram flores bem bonitas e eu tinha uma aquarela novinha comprada com troco de várias caixas de leite.

Quero eu saber se Gwydion – meu nome nem é esse de verdade, ou Juliana “Dark” pensam de deuses alienígenas? Mas eles querem minha opnião, mesmo eu só querendo desenhar.

Faço um sinal pro meu ouvido. “Não escuto”, quero dizer. Significa um pouco “não me importo, obrigada, me deixem desenhar”.

Gwydion, direto dos seus livros de teoria da conspiração e Ashtar alguma coisa que me convencer de que as pirâmides, qualquer pirâmide, foram feitas por inteligências alienígenas superiores. Eu realmente preferiria desenhar.

--- Tipo o super-homem? --- pergunto.

Ouço Maeve rir da cozinha. Ela é legal, apesar do nome doido.

--- De uma forma simplória, pode ser considerado assim. Há seres nesse universo que são mais fortes e inteligentes que os humanos e, apenas eles, poderiam ter construído dessa forma. As construções são iguais, em lugares improváveis e partindo de civilizações completamente diversas. Tem até naquele livro que você gosta, Juliana, da Marion Zimmer, o de Atlântida, era sobre isso.

--- Não era, não. --- corta Juliana igual sua franja no meio da testa escondendo uma tatuagem que sua mãe não ficaria feliz em ver. --- Todo mundo era humano naquele livro. Eles saem do Mediterrâneo pra Inglaterra, não da nave espacial. Bobão --- sussura esta última palavra e me vejo obrigada a desgostar menos da melhor amiga da minha irmã, apesar dela ainda ser uma sebosa.

--- Pirâmides parecem fáceis de fazer. São legais de montar em blocos, em escala gigante devem ser legais também. --- E sorrio bem amarelo.

Isis Morgana grita da cozinha que a pipoca está pronta.

--- E, se deuses são alienígenas, eles perdem o sentido onipotente e se tornam apenas parte da ancestralidade, o que torna idiota fazer orações, ou, mais idiota, --- continua Juliana --- esperar que eles tenham se comunicado com vários grupos diferentes por gosto e partilhado conhecimento como se estivessem de férias.

Ok, talvez valha a pena eu não desligar meu aparelho auditivo pra ouvir esses doidos se bicando.

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Dia 11: Faça a Investigação de Um Crime

Ok, o que temos aqui?

Os restos mortais foram deixados na cena do crime e a arma foi atirada o mais longe possível sem ser nogento. Agora temos uma pia com restos de doce de leite esparramado e um pote vazio na geladeira.

Alguém deixou o pote vazio na geladeira e terei que investigar todos os suspeitos.

Aposto que houve um propósito maior neste crime! Como eu vou rechear bolo em cima da hora sem doce de leite? Vou fazer Isis Morgana correr com meu pai de carro pra baixo e pra cima até achar o mercado aberto. Ela vai comprar o kilo para mim. Ela verá.

A lista de suspeitos incluem todos os amigos de Isis Morgana com quem eu não quis dividir doce de leite, meu pai e, obviamente, bem, tenho dúvidas se Isis Morgana ou Jaqueline cometeriam tal crime. Ambas teriam acesso ao bolo de forma irrestrita.... Unh, dúvidas. Ainda assim, não posso excluir nenhuma das duas entre os possíveis meliantes.

Morgana Gwydion Igrainne Arthur, que tem esse nome de verdade Lua Juliana Dark meu pai Jaqueline

Formando uma lista de oito suspeitos. Terei que envolver Isis Morgana na minha investigação, de outra forma, os amigos dela podem acabar não sendo levados a justiça! No caso, eu vou, Isis Morgana vai, na verdade, fazê-los pagar o preço do doce de leite. Eu só preciso descobrir de quem foi a culpa.

Passos na cozinha me fazem saltar de susto.

--- Pai! --- suspiro. --- Você tem que fazer barulho andando na cozinha! Andando em qualquer lugar. Não pode fazer isso!

--- Eu vi a bagunça na cozinha mais cedo. --- Mais cedo? Está assim desde de manhã?! Podia ter enchido de formiga e nunca mais teria saído! --- E como você ia usar doce de leite e fazer bolo, bem, eu trouxe mais um pouco. Pra conseguir rechear tudo.

E não é que achamos o culpado?

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Dia 10: Uma Sinopse Convincente

Não é uma sinopse convincente, mas é o que eu quero escrever em Subterrâneo, é o que eu quero pra história.

Nísia está sendo assombrada. Do que ela sabe sobre assombrações, elas sempre tem um motivo. No Mabinogion, quando Pywll, Pwywll, Nísia nunca lembra o nome, por que ela não escuta direito e Isis Morgana, sua irmã mais velha, adora nomes difíceis e coisas celtas com nomes impraticáveis. Nísia acaba não sabendo se escutou certo ou se aquela confusão de vogais com som de consoante.

Por estar sendo assombrada, Nísia precisa descobrir o motivo, se é algo que a assombração fez, e por isso a assombração está presa nesse mundo, se é algo que Nísia fez, então precisa se desculpar, igual Pwyll, ou sei lá o nome dele, e, se é um cara atrás dela, bem, ela precisa de amigos que possam dar um susto no cara abusado e assustador.

Nísia também precisa descobrir o que fazer da própria vida. Ela fez dezoito, tem um curso técnico e nenhuma perspectiva – palavra chique, perspectiva. Não sabe o que fazer da vida e onde ela mora não dá muitas opções. As pessoas que ela conhece também não tiveram muitas opções e isso acaba bem desanimadora pra uma jovem que vê muita televisão e seu emprego vai ser na única fábrica da cidade, a mesma que seu pai e todo mundo da cidade trabalha.

Sim, pesquisar assombrações é bem legal, mais legal que qualquer outra coisa que possa acontecer depois dos dezoito.

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Dia 9: Resuma seu Livro Favorito sem Usar Nomes.

Esse é fácil! O livro favorito da família é óbvio, pois todas bruxas e não vai ser nenhuma dificuldade pra mim resumir ele todo sem nomes.

O livro favorito de Isis Morgana e Nísia é o mesmo que era favorito da mãe delas, que tinha um nome muito comum, aliás. Tão livro favorito que o nome da filha é o mesmo da personagem. É uma história gigante, um épico sobre a construção de um país apesar do cristianismo e cheio de bruxarias no meio e bruxas lutando contra cristãos, por que os cristãos querem estragar tudo que anos de experiência mágica e mística construída por druidas e sacerdotisas e toda a  ancestralidade que isso carrega.

Tem um monte de deusas que são uma só, uma espada mágica e um monte de sacerdotisas numa ilha sagrada mágica e especial.

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Dia 8: Uma Carta Escrita para seu Eu Daqui a Dez Anos

Poderia ser para o eu de dez anos atrás, mas preferi essa opção

Isto, diferente dos outros tópicos, foi escrito pela Rainha, pela Diva, pela Maravilhosa, Mágica e Mística, Isis Morgana e ficou um lixo, mas é assim que ela se sente, de forma geral. A gente precisa escrever para ter certeza.

 Cara Isis Morgana do Futuro,

Você precisa de planos. Precisa pensar na sua irmã e não pode esquecer dos planos, de que sua irmã precisa de você. Precisa sonhar com coisas reais agora. Em permitir os sonhos de outras pessoas, da sua  irmãzinha, do seu pai. Ele vai sentir que falhou se você falhar.

Você vai ter que aprender a cozinhar coisas que tenham gosto e não misturas para chá.  Sua vó com doze anos já sabia cozinhar. Com todo o potencial que você apresenta, vai ser fichinha! Fazer meu pai e irmã sobreviverem saudáveis, irem no médico, sentirem falta de nada.

Você já está escrevendo como uma mocinha, não está? Daqui a dez anos vai ler esta carta e se perguntar como conseguiu fazer essas frases que parecem de adulto, ou não. Tenho que ser crescida agora. Será que Nísia vai lembrar da mamãe?

Eu não quero esquecer o cheiro que ela tinha, ou o som da voz dela. Não tem nada gravado. Fotos não tem o suficiente pra que eu lembre como era afofar seu cabelo de manhã querendo que os cachinhos aparecessem. E ela mexeria no meu cabelo, ajudaria a marcar os meus cachinhos com algum creme cheiroso que ela batizou com alguma coisa como babosa ou mel ou chá. Agora nunca saberei a receita do que ela colocava no yamasterol, mas era especial.

Tanta coisa que ela não vai me ensinar agora.  E adeus aos domingos que deveríamos estar comendo pizza, todo mundo, na frente da TV. E eu poderia roubar o aparelho de audição da Nísia e enquanto finjo que conto um segredo.

Isso aconteceria uma hora ou outra.

Você precisa manter as tradições e construir novas. Precisa fazer meu pai fazer a barba, se não ele nunca vai arranjar uma namorada e imagino que isso seja inevitável. Minha irmã não pode terminar o ensino médio muito tempo depois da época certa e vai fazer faculdade igual as pessoas da televisão.

Vou lembrar de todas as deusas que minha irmã se importava, por que vou precisar. É mais uma coisa que você, Isis Morgana, não pode esquecer. Não há nenhuma promessa de figura materna no seu futuro e você precisa de alguma certeza, de alguma proteção e afeto. Se você absorver essa energia da Deusa, pode transmitir essa energia para sua irmã e para sua casa.

Daqui a dez anos você terá 22 e se sentirá um lixo se todas as promessas que fez a si mesma não estiverem cumpridas. É melhor começar a planejar tudo de agora. Perguntar para Nísia o que ela quer fazer da vida. Não deixar seu pai fazer besteira e checar as contas, por que segundo tia Luísa, é agora que os pais começam a tirar dinheiro de casa pra por na rua. Você vai ter feito tudo isso.

Eu confio em você. Confio que você vai conseguir.

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Dia 6: Sem Adjetivos

Aula de metáforas. Uau! Chacoalhou meu cérebro. Antes fosse por que a matéria é do mesmo nível que orações subordinadas e chega o momento em que nada faz sentido. O que você entendeu não existem mais, jovem! Muahahah! O vilão sorri! Regojiza-se! Estou numa aula de português. Devo mostrar vocabulário! Será que está escrito como tem que ser? Estou sem dicionário. Não vou pedir pra ir no banheiro para procurar na biblioteca como se escreve regoji…zar? Fessora, não tem necessidade de duas aulas pra ensinar metáfora, tem? Uma hora e, cinquenta com cinquenta, é cem, menos sessenta, quartenta, uma hora e quarenta. Precisa? Não tem precisão disso! Desenho leões. Leoas não, a juba ajuda a esconder erros de proporção. Leoas precisam de referência e eu estou na escola. E se eu fosse para a biblioteca desenhar leões?!Seria dedurada pela bibliotecária, exceto se eu entrasse no recreio! Ela não notaria se eu fui ou não embora, notaria? Meu nome na carteira está apagando. Retocar esse “Salve Dionísia” sem que a professora perceba. Ela me taca giz se me ver fazendo grafite nos bens da escola. Bem, minha cara senhora. Isso é arte! E por causa disso! Deste pensamento, vou estilizar todas as letras. As letras terão vinhas e uvas e talvez eu desenhe um leão do lado, pra ficar chique. Não… Isso vale usar o aquele caderno. Abrir uma folha  para ter bastante espaço, para não ter nada misturado no rascunho. Oui oui oui metáforas. O que tem de tão importante nelas?

Por ser mais chatinho, eu não consegui escrever a voz da Nísia direito. Neste exercício, em especial, a primeira voz ficou muito parecida comigo escrevendo. Cortar isso à partir de hoje. E voltar para o mínimo de 500 palavras, né não?

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Dia 04: Um Texto Sensorial

Alguma coisa me cutucando, algo pequeno. Agulhinhas esbarrando em mim. Dão uma sensação natural de desconforto. Não dóem, me afligem, dão nervoso. Não é uma só mais. São várias agora. Envolve meu pulso. Inibe meu tato. Só consigo sentir as perninhas.  Pontinhos subindo pelo meu braço, como aquele último estágio do pé dormido que parece infestado por formigas. Por quê ainda não levantei meu braço e sacudi essa coisa para longe? Tirar logo esse troço de mim. Odeio essa sensação. Odeio insetos. Levanta o braço! Levanta! Levanta que isso tá no seu cotovelo! É igual aquele filme da múmia. Vão entrar na minha pele e devorar meus orgãos! E agora? Tento fazer um impulso com o meu tronco. Qualquer coisa para fazer esses bichinos saírem do meu braço. Como eu não consigo me mexer? As patinhas estão subindo, logo estarão no ombro. Eu não consigo me mexer. Arde. E eu não sei se é dormência ou se são formigas. Dormência não deveria parecer ferroadas. Não deveriam me deixar imóvel. Eu nunca tive um sonho assim. Sonho? Então eu posso cair. E acordar. A voz de Isis Morgana com as orações ao fundo. Volta para a voz da Isis Morgana. Desperto com ela sentada na minha beirada e um incensário do meu lado. “Onde você esteve? Seu braço está horrível” As marcas de picadas no braço esquerdo estão todas lá. A pele irritada dos pontinhos roxos. Agora consigo me mexer, ao menos. — Vou te levar pro hospital. Menina assombrada. Tá ruim, mas é isso, se não acabo não postando.

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Dia 03: Descreva uma Paisagem

Eu moro no sexto andar. São dois prédios, um na frente do outro. Uma portaria única. Tem a rua, aquela principal, aí quase no final, virar a esquerda. É a minha rua. Dar meu nome na portaria, ir até o prédio de trás e subir. Não pode reparar, o apartamento é pequeno. Tu entra na sala, aí vai direto em direção a uma mesa redonda que vive cheia de livros e toalhas coloridas da Isis Morgana, ela usa para tirar tarot em cima. A mesa e a toalha. A direita tem a porta para a cozinha, com a cortina de bambuzinho que sempre falamos em trocar, mas ainda está ali, cheia de gordura. A cozinha é um cubículo quadrado, com uma mesa, duas cadeiras e um banquinho na parede da porta, uma janela do lado oposto que dá de cara para outro prédio. Fogão, geladeira e um armário de cozinha. O beiral da janela é sujo de noda de todos os matos que Isis Morgana botou para secar ali. A geladeira faz barulho quando a gente abre a porta. As portas do armário são todas tortas e pelo menos dois pés do fogão são tocos de madeira, por que os pés de verdade enferrujaram. Desse mesmo lado da casa tem o quarto do meu pai. Ele ficou com o quarto menor, que só cabe uma cama de solteiro. Se ele namora na rua, e deve, a gente não sabe. Ele não apresenta ninguém pra gente. Pelo quarto dele ser menor, os móveis são novos, para caber tudo dentro do espaço pequeno e compensar o tamanho do quarto. Pelo menos eu penso assim. No resto da sala tem um sofá, a estante com a televisão de 20 polegadas, um sofá de três lugares e uma poltrona. A coleção de bolachões do meu pai fica no quarto dele. Tem receita pra espantar humidade e tudo. Na sala, ao invés da coleção de cds, que ficaria muito bonito, tem um milhão de xerox e livros largados da Isis Morgana, livros escolares guardados para pesquisar trabalhos, fitas que não cabem mais nas gavetas. Isis Morgana também mantém um altar mais simples ali, junto com fotos em porta-retratos de modelos diferentes. Claro que o altar simples de Isis Morgana é uma estátua de um palmo, um vaso de flores, uma jarra com água, conchas e um pouco de areia da praia. Na direção da estante está a janela e uma mesa de telefone. O vaso de pavão para Hera fica nele. Lembro de Hera ser especial para minha mãe. As flores que ficam nele sou eu quem escolhe. Antes eu roubada do jardim da vizinha, agora acabo comprando uma ou outra rosa sempre que aparece dinheiro, ou que a flor comece a murchar. Tem um banheiro pequeno depois, meio que de frente pro quarto do meu pai. A janela fica no box e não ajuda muito com a humidade. As escovas de dente ficam num copo em cima da pia e minha irmã faz sachês cheirosos com castanha de caju. No nosso quarto, meu e de Isis Morgana, tem uma cama daquelas que tem outra embaixo para puxar. Ela dorme na de cima. Dividimos um guarda roupa e uma cômoda. Ela sempre rouba um pedaço do meu espaço. Tem coisas demais. Guarda tudo. Diz que vai organizar o espaço e arranja mais caixas. Duas das gavetas da cômoda foram dominadas por xerox e velas, como uma boa parte do guardarroupa é ocupada por roupa de cama, toalhas e material de bruxaria, as caixas maiores, linhas de crochê e filtros dos sonhos ainda não terminados para aniversários. O quarto é limpo, mas fingimos que todas aquelas caixas não estão ali muitas vezes, jogamos um paninho em cima.

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Dia 01: Crie uma Personagem do Zero

(Estou robando por que a Nísia já existe, mas sempre vale o estudo)

Dionísia Brigitte Santos Bettancourt Guimarães odiava escrever perfis. Neste caso, ela estava sendo obrigada, é claro e tinha parado de escrever exatamente no nome completo. Não era ódio, mas ela não tinha nada em especial para escrever além das competições de xadrez e o próprio nome. “Adoro você professora de português que vai nos fazer pensar sobre o futuro!”, bem ranzinza.  Pensar sobre suas possibilidades a deixava chateada. Ela faria o que todos antes e depois dela fariam naquela cidade do interior. Usar o curso técnico para arranjar um emprego na firma grande da região, onde todo mundo que ela conhece também trabalha, ou onde mais a aceitarem. A incomodava que ela queria escrever, mas não tinha o que escrever. Tantas outras coisas valendo nota pra se importar e escrevendo redação sobre o futuro. Esperava que valesse alguma pontuação extra. Nísia ia precisar. Conseguiu levar bomba em quase tudo no terceiro bimestre e seria muito bom não se preocupar com português quando fosse estudar tudo que precisava para todas as outras matérias. Encarou o teto, o lápis, o papel. Ela não queria escrever sobre si, ela queria escrever sobre a família toda. Descrever os tarots da Isis Morgana, o que ela ganhou da mãe, o que ela comprou para usar em leituras pagas, um ganho de um ex-namorado e outro encomendado, e Juno do Céu, ela estava feliz quando ele chegou. Tinha sido encomendado com o cartão de crédito do Arthur, pela irmã do mestre de Reiki do homem conhecido como Gwydion - Nísia não aguentava os nomes de Brumas de Avalon dos amigos da irmã - encomendar na Itália. Poderia muito bem, e se sentiria muito bem, escrevendo sobre seu nome. Por mais diferente que fosse, era seu. Uma referência a dois deuses, Dionísio e Brigid. E tinha a Brigitte Bardot e a Nísia Floresta. Não era sobre ela, exatamente, mas seria um texto. Queria contar a história de seus pais escolhendo seu nome usando oráculos e meditações. Isis Morgana foi por promessa e gosto. O dela não, deu mais trabalho. Horas de conversas místicas com a Deusa, jejuns de seu Leco, o pai de Nísia, e sonhos da pequena Isis Morgana com vinhas e heras. Isis Morgana ter sonhado com hera e o nome sair Nísia, foi confuso para Isis pequena. Precisou ser explicado que hera só chama assim aqui, mas a planta era de Dionísio, igual a irmã também seria. Em certa medida. Será que ela poderia escrever que sabe todas as falas de Labirinto sem a professora insistir que ela faça algo incoveniente, como teatro? Melhor, ela vai me fazer escrever naquele jornal da escola ridículo em que todo mundo só lê as pedreiragens. Teve a ideia de escrever sobre seu gosto por alienígenas e lendas urbanas. Talvez criar uma história sobre seu contato com extraterrestres e um passeio a Varginha. Ela estava bem, estava ok, estava satisfeita. Queria coisas pequenas que poderiam se conseguidas em pouco tempo. Gostaria de comprar um pote grande de sorvete, por exemplo. Ou pagar a faculdade da irmã, isso seria muito bom. Nísia só queria essas duas coisas, sorvete e a faculdade da irmã.  Não escreveu nada disso. Ela não iria pagar esse mico. Pediria para Jaqueline revisar. Escreveu que gostaria de trabalhar com pessoas e que é muito apegada a família, mais algumas coisas que achava que se usava para escrever currículo, palavras como “comprometida”, “engajada” e “pro-ativa” e ninguém se importa se é de verdade, por que é o que todo mundo escreve. Trocou lenda urbana por “gosto pela história local” e família bruxa por “valores tradicionais e contato com a natureza”. Dá na mesma para quem sabe ler. Ficou ligeiramente tentada a sentar no computador e pesquisar sobre o chupacabra. Olhou a pilha de  livros em cima do sofá e desistiu. Levantou da mesa da sala para pegar o livro de Geografia. Suspirou. “Globalização, será, então”.

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